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Por que dividir em funções vitais?
Todos os seres vivos necessitam realizar suas funções vitais de alguma forma. Até mesmo uma bactéria, unicelular aeróbica, respira, digere e excreta nutrientes, etc. Com tamanhos, complexidades e ambientes tão diferentes, é de se esperar que existam distintas estratégias, adaptadas ao ambiente que vivem. Aqui, vamos conhecer algumas, para que nos lembremos sempre que diversos mecanismos evolutivos estão por trás dessas estruturas e processos metabólicos tão incríveis.
Há uma relação entre um sistema circulatório especializado e o tamanho dos seres vivos?
Quando pensamos sobre oxigênio, sangue e coração logo nos vêm o nosso sistema circulatório em mente. Para nós, ele tem a importante função de transporte de gases (O2 e CO2) e outras substâncias vitais (células de defesa, glicose, gordura, etc). Para compreendermos a importância de um mecanismo especializado em transporte, vamos observar o seguinte fator: se não for por um sistema de vasos/canais, como mais os gases e essas substâncias poderiam se transportar? A resposta é: por um processo chamado de difusão (célula a célula), como se fosse aquela brincadeira dos “escravos de Jó” ou da “batata quente”. Entretanto, quando estamos falando de animais que possuem 2, 5 ou 10 metros de comprimento e trilhões de células, pensar num fluxo de nutrientes célula a célula é basicamente impossível. Mesmo que exista uma diferença de concentração entre as células vizinhas para impulsionar estas substâncias em favor de um gradiente, esse movimento se torna muito lento e ineficiente pra um indivíduo com mais de alguns milímetros. “O tempo que uma substância leva para
se difundir de um lugar a outro e proporcional ao quadrado da distância”. Por exemplo, “a quantidade de glicose que leva 1 segundo para difundir-se 100 μm, levará 100 segundos para difundir-se 1 mm e quase 3 horas para difundir-se 1 cm. Essa relação entre tempo de difusão e distância impõe uma restrição significativa ao plano corporal de qualquer animal”. Portanto, agora fica mais fácil entender que os sistemas circulatórios e de transportes de substâncias são adaptações evolutivas que permitiram que as espécies animais e vegetais pudessem se tornar cada vez maiores em tamanho. Mas atenção para não se confundir: o fato de possuir um sistema circulatório, com coração e tal, não significa que o indivíduo tenha que ser grande. Um bom exemplo são os mosquitos, que tem tamanho médio de 1,5 cm e possuem sistema circulatório, como veremos a frente. O que a relação entre restrição de tamanho e sistema circulatório nos mostra é que o transporte de gases e substâncias é tão potencializado por uma rede especializada de condução que isso abre possibilidade para que possam existir mais tecidos, mais complexos, em uma estrutura corporal maior visto que o oxigênio e nutrientes chegarão a praticamente todos os tecidos vivos através da circulação.

As Brófitas (conhecidas como "musgos") são plantas que normalmente têm seu pequeno tamanho atribuído à ausência de sistema condutor. Apesar de algumas espécies possuírem algumas células de condução, elas não se organizam em feixes especializados e sistema como nas pteridófitas, gimnospermas e angiospermas. Observe a foto acima. Os musgos são os que estão formando um tapete verde no chão. Normalmente não passam de 10 cm de comprimento. As árvores desta imagem passam de dez metros de altura, mas temos registros de uma espécie de Gimonsperma que pode chegar a surpreendentes 115 metros: as sequóias-gigantes (Sequoiadendron gigantea). OBS: elas podem chegar a 3 mil anos de idade.
Existem ainda, animais que, mesmo sem um sistema circulatório distinto, conseguem alcançar mais de 10 cm, como alguns cnidários e platelmintos. Como isso é possível? Existem duas principais adaptações que tornam isso possível: a primeira é um plano corporal especializado, onde a grande maioria das células superficiais, que estão em contato direto com o ambiente, conseguem realizar trocas com ele. No mar, onde estes animais invertebrados vivem, existem quantidades consideráveis de material orgânico dissolvido (incluindo aminoácidos, os monômeros das proteínas). também há uma quantidade de oxigênio dissolvido. No caso das Hidras e águas-vivas (espécies de cnidários), elas possuem uma cavidade gastrovascular central para distribuir as substâncias que foram captadas nas células de revestimento da cavidade para todo o corpo. Nos vermes chatos maiores (platelmintos, por exemplo), esta cavidade gastrovascular pode conter ramificações internas para otimizar essa troca (na foto ao lado a cavidade está destacada em amarelo) e o corpo anatomicamente bem achatado também ajuda, pois quanto mais fino, menos camadas de tecidos ele possui, facilitando o alcance destes materiais orgânicos.
Estratégias para otimizar a captação e distribuição de nutrientes e gases

Tipos de Sistema Circulatório


Agora que vimos a importância evolutiva dos sistemas circulatórios, vamos entender um pouco melhor no que eles consistem. Todos os animais que possuem um sistema circulatório contam com três componentes básicos: um líquido circulatório, vasos conectados e uma bomba muscular (coração). Estes três componentes funcionam em conjunto da seguinte forma: “o coração propulsiona a circulação usando a energia metabólica para elevar a pressão hidrostática do liquido circulatório, a pressão que o liquido exerce sobre os vasos circundantes. O líquido então flui pelos vasos [através do corpo do animal] e retorna ao coração”.
Estes vasos, em indivíduos maiores, consistem em uma imensa rede ramificada que percorre todas as áreas, mais internas ou mais periféricas, do corpo. Por esse motivo, mesmo que você corte a pontinha do dedo, verá sangue extravasar o vaso em uma pequena e inofensiva hemorragia. Os sistemas circulatórios podem ser abertos (SCA) ou fechados (SCF).
Sistemas Circulatórios Abertos (SCA)
Nos SCA, o liquido circulatório é denominado hemolinfa, pois é também o líquido intersticial que banha as células do corpo; são vistos em artrópodes e alguns moluscos. Nos insetos, o esquema geral do sistema circulatório é o seguinte: um único vaso percorre o dorso do animal, de forma longitudinal (confira na imagem). Este vaso é denominado vaso dorsal. Ele é aberto na sua extremidade próxima à cabeça (região chamada de aorta) e fechado na extremidade próxima ao ânus (região chamada de coração). Através dessa abertura na extremidade da aorta, a hemolinfa abandona o vaso dorsal e cai no grande espaço interno do tórax chamado hemocele.
A hemolinfa, ao que a descrição acima dá a entender, circula sob baixa pressão. O coração, bomba muscular que impulsiona a hemolinfa através do vaso dorsal, é constituído por câmaras em série, isto é, que aparecem em sequência. Estas câmaras surgem a partir da tração exercida por músculos alares. Imagine que estas fibras musculares, presas em ambos os lados, puxem, cada parede para um lado, tracionando-as. Espera-se que o espaço interno do vaso aumente, certo? Exatamente neste sentido formam-se câmaras que funcionam como bombas na medida que aumentam e diminuem o espaço interno a partir da ação destes músculos alares, diminuindo e aumentando (respectivamente) a pressão hidrostática para impulsionar a hemolinfa. Quando o coração dilata (movimento de diástole), pela contração desses músculos
alares, a hemolinfa que está na hemocele é puxada para dentro do coração passando pelos ostíolos, que são pequenas válvulas localizadas lateralmente no coração. Quando o coração contrai (sístole), as válvulas ostiolares se fecham e a pressão aumenta, empurrando o líquido em direção a aorta (e a cabeça do animal).



Pense bem e responda: quais as vantagens evolutivas de um sistema circulatório fechado em relação a um aberto? Uma dica: pense na separação de ambientes e na pressão sanguínea
Em suma...
Vimos a circulação aberta em artrópodes (incluindo crustáceos, insetos, aracnídeos, etc) e na maioria dos moluscos, excluindo apenas os cefalópodes, como polvos e lulas. Caso não tenha ficado exatamente claro ainda, a circulação aberta tem como principal característica o compartilhamento do fluido que passa dentro dos vasos com o fluido interno do corpo. Na circulação fechada, o sangue só circula dentro dos vasos sanguíneos.
Os moluscos podem ser encontrados no mar (p.ex. polvos), na água doce (p. ex. bivalves) e no ambiente terrestre (p.ex. caramujos, lesmas). No caso daqueles aquáticos, obtém o oxigênio pela hematose branquial (isto é, através das brânquias); no caso dos terrestres, pela hematose pulmonar. Os moluscos já possuem bastantes funções internas concentradas em sistemas especializados. Possuem pulmões/brânquias, rins, coração, intestino, órgãos sensoriais, órgãos reprodutores (pênis e vagina), etc. Quando se trata da circulação, como já adiantamos no título: a maioria possui um sistema aberto (as exceções são os cefalópodes, grupo das lulas e polvos). Isso significa que eles também possuem uma hemolinfa que circula em baixa pressão. O coração dos moluscos possui duas aurículas e um único ventrículo e funcionam da seguinte forma, nos aquáticos, essas aurículas drenam o sangue a
partir de cada brânquia (Gill, em inglês) através de vasos eferentes e depois passa para o ventrículo, que com força muscular, bombeia o sangue para a aorta única, que fica na porção anterior do animal (isto é, “próximo à cabeça”). No esquema ao lado, é o que está com cor vinho. Perceba que depois do coração (Heart) o vaso leva o sangue para uma abertura anterior também, assim como nos insetos, fazendo com que a hemolinfa caia na hemocele, na massa visceral ("Visceral Mass").
Lula e o polvo


Alguns moluscos também possuem sistema circulatório aberto
Ter um sistema circulatório aberto é ruim, pior ou mais primitivo?
Se essa pergunta passou pela sua cabeça, fica uma dica: não use esses termos para definir nada quando se trata de evolução. Cada espécie animal possui uma estrutura diferente, que está diretamente relacionada com a sua forma de vida. As espécies não-extintas mais antigas do mundo, com 2,5 bilhões de anos de idade, são as Cianobactérias. Elas consistem em indivíduos unicelulares, resistentes, amplamente distribuídas, se reproduzem assexuadamente, têm uma taxa de mutação extremamente baixa e uma alta tolerância a ambientes extremos. Essas são as principais características que garantiram sua sobrevivência a todas as três grandes extinções em massa que a Terra viveu. Então, embora a reprodução assexuada, por exemplo, tenha surgido antes da reprodução sexuada, não quer dizer que ela é "pior", "desvantajosa", etc. Ela, pelo contrário, foi/é uma característica importante para a sobrevivência das cianobactérias através do tempo geológico da Terra.
Seja reprodução sexuada ou assexuada, circulação fechada ou aberta, cada sistema oferece vantagens evolutivas. Por exemplo: "As pressões hidrostáticas mais baixas, geralmente associadas aos sistemas circulatórios abertos, os tornam menos dispendiosos do que os sistemas fechados em termos de. gasto de energia. Em alguns invertebrados, os sistemas circulatórios abertos têm algumas funções adicionais: as aranhas, por exemplo, utilizam a pressão hidrostática gerada pelo seu sistema circulatório aberto para estender suas pernas". Ou seja, todo ser vivo possui um conjunto de características que o permitem viver e competir no ambiente e no tempo que se encontra. Essas características podem sofrer mudanças e quando assim forem, são positiva ou negativamente selecionadas pelo ambiente.
O Sistema Circulatório Fechado (SCF)

Todos os vasos sanguíneos (artérias, veias e capilares) de uma mão humana adulta. Nas pontas dos dedos vemos o chamamos de leito ou rede capilar.
Os anelídeos (p. ex. minhocas), cefalópodes e todos os vertebrados possuem um sistema circulatório fechado. Nesse caso, o sangue flui apenas dentro dos vasos sanguíneos. Em relação aos humanos, se considerarmos um homem adulto, a extensão total dos vasos sanguíneos é suficiente para dar duas voltas na Terra pela linha do equador. O sangue, como nos animais de circulação aberta, só flui em um sentido e possui diversos mecanismos para garantir isto. Os principais tipos de vasos sanguíneos são as artérias, veias e capilares. As primeiras transportam sangue do coração para os órgãos, as segundas, dos órgãos para o coração. É importante salientar esta diferença pois é muito comum vermos as pessoas dizendo que as artérias carregam sangue rico em oxigênio e as veias, pobre em oxigênio, mas isso nem sempre é verdadeiro. Elas se diferenciam pela direção que transportam o sangue. Normalmente, nos esquemas e desenhos as artérias são representadas em azul, por transportar o sangue para longe do coração; as veias, em vermelho, por transportar o sangue em direção ao coração. As artérias e veias costumam ser bem calibrosas e ir se ramificando cada vez mais (artérias para arteríolas; veias para vênulas), para se espalhar para o corpo todo (dividir para conquistar!), tornando-se cada vez mais delgadas. Os capilares são, portanto, vasos microscópicos com paredes muito delgadas e porosas. Desta forma, os capilares conseguem chegar a todos os tecidos do nosso corpo (se você for no espelho agora e olhar a parte branca do seu olho, a esclerótica, vai perceber vários capilares que irrigam os seus tecidos oculares).

Outra rede de capilares também muito importante é aquela que envolve os alvéolos pulmonares, que através das suas finíssimas paredes (com espessura de apenas uma camada de células, apenas) permite a rápida passagem de gases do interior dos alvéolos para a corrente sanguínea. Os capilares podem ser destruídos e reconstituídos a todo o momento no nosso corpo, uma vez que em diversas situações estes vasos microscópicos podem "estourar". Isso pode ser por vias de uma doença, inflamação, alta pressão sanguínea, alta pressão atmosférica, trauma local ou vários outros motivos.
Quando você dá uma pancada muito forte e fica roxo, essa coloração na pele é devida a uma pequena hemorragia interna local causada pelo trauma. A conjuntivite, por exemplo, pode levar uma inflamação forte na conjuntiva do olho, fazendo alguns capilares estourarem, deixando o olho com aparência de "bola de sangue". Claro que, depois de tratada, o sangue é reabsorvido e a rede capilar se regenera integralmente. Nos vertebrados vemos dois esquemas de circulação fechada: simples e dupla. A diferença reside, basicamente, na quantidade de vezes que o sangue passa pelo coração durante um circuito completo. Na simples, vista na maioria dos peixes, o sangue passa pelo coração apenas uma vez: do coração para as brânquias e, em seguida, para os tecidos sistêmicos e de volta ao coração. Nos outros vertebrados (mamíferos, aves, répteis e anfíbios), vemos a circulação dupla. Onde o sangue passa duas vezes no coração a cada circuito: o sangue sai do coração para os pulmões para serem oxigenados, voltam ao coração (1ª) para que ele bombeie o sangue oxigenado para os tecidos sistêmicos; depois de oxigenar os tecidos, o sangue volta ao coração (2ª) pobre em oxigênio, para ser bombeado aos pulmões novamente. A diferença é que na circulação dupla é adicionado um circuito menor chamado de circuito pulmonar ou pequena circulação.

No caso da circulação dos anfíbios o 'circuito pulmocutâneo' é assim chamado pelo fato deste grupo de animais respirar também pela pele! Esse é o motivo pelo qual, aliás, é tão cruel jogar sal nos sapos: eles precisam ter a pele úmida para difundir os gases (O2 e CO2). O sal faz a pele desidratar e o animal morre por asfixia e desidratação.

Em termos evolutivos, a diferenciação entre o circuito pulmonar/ pulmocutâneo do circuito sistêmico é um fator importante para a adaptação dos animais à vida terrestre. Que outras adaptações você consegue pensar? Pense na pele, na reprodução, etc.
Tem curiosidade sobre como ocorre a respiração dentro da água a partir de brânquias? Lá em baixo, na parte de respiração vamos explicar! Enquanto isso, veja aqui como se organiza num peixe, a sua circulação simples. Claro que esse é um esquema simplificado, e que existem muito mais vasos se ramificando e percorrendo o corpo do animal!

Primeiro é preciso salientar que é muito difícil generalizar “coração do anfíbio”, “coração do réptil” pois dentro deste grande grupo existem diferenças muito fortes, que não podem ser ignoradas. No caso dos anfíbios, temos espécies que utilizam respiração cutânea, branquial e pulmonar, e isso, evidentemente, traz mudanças no esquema circulatório. Feita esta observação, entendam que as descrições feitas a seguir podem não abarcar todos os animais do grupo e sim o modelo ou a maioria.
Quando falamos de câmaras do coração, estamos falando de câmaras musculosas que se enchem de sangue quando se expandem e impulsionam o sangue quando se contraem. Estes movimentos são chamados de diástole e sístole, respectivamente. As câmaras podem ter dois nomes dependendo da sua função: átrios e ventrículos. Normalmente os átrios são menores que os ventrículos, e trabalham recebendo o sangue. Os ventrículos, por sua vez são maiores e normalmente bem musculosos, sendo o responsável pela força de impulsionamento do sangue que vai percorrer todo o corpo. Normalmente, o coração possui diversas válvulas, nas conexões entre vasos e câmaras e também entre câmaras, para evitar o refluxo de sangue. Isso é importante para garantir que o sangue só flua em uma direção.

As aves e mamíferos possuem quatro câmaras, fazendo o circuito duplo ser completo e totalmente eficiente no sentido de separação do sangue rico e pobre em oxigênio. “Diferentemente dos anfíbios e muitos répteis, as aves e mamíferos, não podem variar o fluxo sanguíneo para os pulmões sem variá-lo por todo o corpo em paralelo”. Isso, embora reduza a resistência à interrupção na respiração, fornece uma alta eficiência no fornecimento de oxigênio para os tecidos, visto que não há mistura no coração. Esse é um importante fator para estes animais uma vez que eles são endotérmicos, isto é, mantém a sua temperatura através da energia metabólica e não do ambiente (eu explico isso em uma postagem lá do Blog). Deste modo, endotérmicos têm que gastar cerca de dez vezes mais energia que um ectotérmico de tamanho equivalente. Por isso, uma alta eficiência no transporte de gases garante uma também eficiente produção de energia nas células.
O coração da maioria dos peixes consiste em um coração tubular, no formato de “S”, que possui quatro cavidades de contração sequencial: seio venoso, átrio, ventrículo e bulbo arterial (alguns autores interpretam o bulbo arterial como parte do ventrículo). Apenas para ressaltar, no esquema ao lado o coração do peixe não está em formato de S, pois está planificado, "retão", mas é só um esquema. O mais semelhante ao formato original é aquele onde tem um peixe e o sistema completo (ali em cima), Entre as câmaras do coração desses peixes, existem válvulas também para coordenar o fluxo. O seio venoso e o átrio possuem paredes delgadas, diferente do ventrículo, de paredes espessas, responsável pela força de propulsão de saída do sangue do coração. O sangue que passa pelo coração dos peixes, que possuem circulação simples, como já dito anteriormente, é pobre em oxigênio.
O coração dos peixes pulmonados, anfíbios e répteis possuem adaptações à circulação dupla, que consistem basicamente numa divisão maior entre as câmaras, visto que agora circula sangue rico e pobre em oxigênio, simultaneamente, no coração destes animais. Em algumas condições, como vou explicar mais a frente, pode haver mistura destes sangues. Nas rãs e outros anfíbios encontramos três câmaras (dois átrios e um ventrículo). Nos répteis, encontramos grupos com três câmaras (tartarugas, serpentes e lagartos) e com quatro (crocodilianos). A diferença entre eles es tá mais no septo ventricular. Isto é, nos grupos que possuem três câmaras, este septo é incompleto, permitindo passagem de sangue para um lado e para o outro. Por isso, neste caso, consideramos o ventrículo como único. Nos grupos que possuem quatro câmaras esse septo é completo, separando bem os ventrículos em esquerdo e direito.
Existe uma questão muito importante a ser comentada em relação às câmaras. Alguns vertebrados são semi-aquáticos, como os anfíbios e alguns répteis. Muitos deles podem passar longos períodos embaixo d’água, apesar de possuírem pulmão. O que pode ocorrer é que eles enchem o pulmão de ar e conseguem passar longos períodos sem trocas gasosas. No caso das rãs e alguns outros anfíbios, vemos três câmaras: dois átrios e um único ventrículo. O sangue rico em oxigênio que chega do circuito pulmocutâneo entra no coração pelo átrio esquerdo, certo? Se ficar confuso, consulte a imagem acima ou abaixo. Do átrio esquerdo, o sangue passa para o ventrículo único. Lá, um sulco vai desviar cerca de 90% do sangue oxigenado para o circuito sistêmico e a maior parte do sangue desoxigenado para o circuito pulmocutâneo. Tá acompanhando? Isto é, mesmo não havendo uma divisão no ventrículo, a maior parte do sangue oxigenado vai pros tecidos sistêmicos e a maior parte do desoxigenado vai para o circuito pulmocutâneo sofrer hematose (receber oxigênio). Mas eu disse “a maior parte”, certo? E os outros 10, 15%? Lembra que eu falei que quando alguns animais semi-aquáticos passam um tempo dentro da água, seus pulmões cessam temporariamente a atividade? Se o circuito pulmocutâneo fosse totalmente fechado pela interrupção da atividade do pulmão, toda a circulação pararia e o animal morreria. Graças a esta divisão incompleta do ventrículo, a fisiologia do animal se ajusta ao período de nado, fechando a maior parte do fluxo de sangue para os pulmões por algum tempo. Isso faz com que o circuito pulmocutâneo não pare, mas diminua drasticamente o seu fluxo sanguíneo. No caso das tartarugas, serpentes e lagartos, possuem um coração com septo incompleto, que vai funcionar mais ou menos como explicamos acima. Pense na tartaruga marinha, que nada por 15 a 30 minutos totalmente submersa (algumas espécies conseguem bem mais). Ela se movimenta bem lentamente, consequência de um fenômeno chamado bradicardia (diminuição significativa dos batimentos do coração). Desta forma, durante o período de apneia, a demanda de oxigênio diminui muito, uma vez que a demanda de energia nos tecidos também diminui. “Nos crocodilos, jacarés e outros crocodilianos, os ventrículos são divididos por um septo completo, mas os circuitos pulmonar e sistêmico se conectam pelas artérias à saída do coração. Essa conexão permite que as válvulas arteriais desviem o fluxo sanguíneo temporariamente para longe dos pulmões, como quando o animal está debaixo d’água”.

Resumo

Evolução das câmaras do coração nos Vertebrados


Esse é um esquema que resume todo o fluxo circulatório, mas gostaria de chamar atenção para alguns detalhes:
1 - Perceba que há uma cor roxa no meio das rede de capilares. Essa cor tá indicada ali na legenda e também explicada nos textos acima da legenda. Entender isso é chave para entender a dinâmica de circulação.
2 - Perceba como os ventrículos (VD e VE) são muito mais musculosos que os átrios (AE e AD). Já falamos disso lá em cima!
3 - Perceba que existe uma veia chamada "porta-hepática". Ela faz parte da circulação porta, que liga por meio de vasos sanguíneos o fígado com os órgãos do sistema digestivo (estômago e intestinos). Isso ocorre pois uma das funções do fígado é de controle do açúcar no sangue (glicemia) e já que ele é obtido através da alimentação, faz sentido que os órgãos digestivos e o fígado sejam conectados.
4 - Perceba que a definição que demos de artéria e veia (lá em cima) é a mais segura pra você não se confundir: a artéria leva o sangue para longe do coração e as veias, em direção ao coração. Mas porque você se confundiria? Por que se você guardar que as artérias levam sangue rico em oxigênio e as veias, pobre, como acontece na circulação sistêmica, você vai errar quando tentar aplica isso à circulação pulmonar. Nela, a artéria pulmonar que leva o sangue desoxigenado para sofrer hematose no pulmão. Depois, esse sangue oxigenado volta ao coração através da veia pulmonar. Ou seja, "inverte", né? Mas na verdade nada se "inverte", é tua perspectiva que tem que ser outra. As artérias levam o sangue para longe do coração e as veias, em direção ao coração. Sempre.
No modelo 3D ao lado, é importante reparar no funcionamento de válvulas e na questão do ritmo cardíaco. O coração é o único órgão que possui musculatura estriada que atua de forma involuntária. Por isso existe uma distinção entre músculo estriado esquelético (aquele associado aos ossos) e músculo estriado cardíaco (que compõe o coração). O esquelético é uma musculatura predominantemente voluntária, enquanto a cardíaca é involuntária. O batimento cardíaco é coordenado por impulsos nervosos altamente ritmados formando o que chamamos de ciclo cardíaco, isto é, o batimento atrial e ventricular denominados sístole e diástole. Quando o coração bate fora do ritmo, há o que chamamos de arritmia. Quando o coração não recebe ou não responde corretamente aos impulsos nervosos de contração, ele pode fibrilar. Na impressão de qualquer pessoa que assiste um coração fibrilando, a descrição correta seria o coração "tremendo". Essa perda total do ritmo cardíaco pode ser revertida com massagem cardíaca ou com um aparelho chamado desfibrilador, que através de uma corrente elétrica determinada, pode ser capaz de reaver o ritmo cardíaco compatível com a vida.

Ao lado podemos ver um esquema que coloca uma perspectiva evolutiva dessas modificações nos sistemas circulatórios simples e duplos. Se já é praticamente impossível separar o funcionamento de todos sistemas de um organismo, é mais difícil ainda separar o funcionamento dos sistemas cardíaco/circulatório do respiratório. Vocês vão conhecer mais nuances dos sistemas respiratórios abaixo.
Para uma correta interpretação da imagem, considere o cinza claro como sangue oxigenado e o cinza escuro como sangue desoxigenado.
RESPIRAR
A respiração, assim como o batimento de um coração, são daqueles eventos na biologia que duram alguns milésimos ou segundos e demoramos décadas para entender e horas para explicar. Já parou pra pensar como um inseto respira? E uma planta? uma estrela do mar? um peixe? uma tartaruga? uma aranha? Você tem certeza que todos eles respiram, mas como? Aqui vamos explorar a respiração comparada, que também tem preceito evolutivo e total relação com a forma de vida da espécie. No vídeo ao lado você pode notar pequenas bolhas, que consistem nos gases gerados no metabolismo vegetal (fotossíntese e respiração).
Ah, só mais uma coisa: essa abordagem comparada que eu trago é bem complexa de montar, pois envolve uma seleção muito criteriosa de quais detalhes vão entrar na narrativa que eu trago a vocês. Claro que eu gostaria de passar semanas escrevendo sobre todas as formas variadas e particulares de respiração de cada grupo, de cada espécie, mas eu preferi (por razões práticas e didáticas) fazer um apanhado bem resumido das principais formas respiratórias pra traçar um panorama evolutivo geral da relação entre as formas de vida e o O2/CO2
Vídeo produzido pelo Laboratório de Ecologia e Dinâmica Bêntica Marinha - UERJ
Por que os gases passam de um ambiente a outro?




A partir de agora vamos falar apenas de organismos aeróbicos e vamos trocar o nome "respiração" por "troca de gases", pois respiração pode confundi-los com o processo bioquímico "respiração celular" e nós não vamos abordar esse processo nessa seção. Então, respondendo a pergunta: a troca de gases entre um organismo vivo e a atmosfera ocorre por conta da diferença de pressão parcial entre os ambientes. Essa frase, apesar de simples, demanda que você conheça alguns conceitos, que vamos facilitar a seguir:
1) Que gases são esses?
No caso estamos tratando dos gases envolvidos na respiração, que são gás oxigênio (O2) e gás carbônico ou dióxido de carbono (CO2).
2) O que é pressão de um gás?
Pressão é a força de colisão de partículas gasosas contra as paredes de um recipiente. Olhe o primeiro gif ao lado. Nos dois recipientes há a mesma quantidade de mols e a mesma temperatura, o que os diferencia é o volume. Com maior espaço interno, isto é, maior volume (primeiro recipiente) as moléculas se chocam com menos frequência com as paredes, logo a pressão é menor. No segundo recipiente, o fato de haver menos espaço de movimentação faz com que as moléculas colidam com mais frequência contra as paredes do recipiente, logo, a pressão é maior. A temperatura também pode alterar a pressão, na medida que deixa as moléculas mais agitadas. Observe no segundo gif. A única diferença entre os recipientes é a temperatura, pois ambos tem o mesmo número de mols e o mesmo volume. A temperatura, portanto, aumenta a agitação das moléculas, aumentando também a força de colisão com as paredes do recipiente, logo, a pressão é maior. A última variável é a quantidade de mols. Se em dois recipientes de volumes e temperatura iguais, um tiver mais moléculas que outro, certamente a força de colisão será maior, logo, a pressão também será maior. Essas três variáveis -volume, quantidade de mols e temperatura- são justamente as componentes da fórmula para cálculo de pressão de um gás, exposto na figura ao lado. OBS: R não é uma variável, é uma constante.
3) Por que chamamos de pressão parcial (pp)?
Porque estamos admitindo que o O2 e o CO2 fazem parte de uma mistura de gases. A atmosfera é um excelente exemplo de mistura de gases. Nela, existem diversas moléculas gasosas, como N2, O2, O3, CO2, CH4, CFC, etc. Cada uma está em uma determinada concentração, exercendo uma pressão parcial que contribui com determinada porcentagem para a pressão atmosférica (total). A pressão parcial de um gás seria a contribuição da pressão desse gás para pressão total da mistura. Logo, a pressão total é a soma das pressões parciais de todos os gases que a compõem a mistura.
Então, quando um gás possui diferença de pressão entre dois ambientes, a tendência é ocorrer a passagem de partículas de um para outro para equilibrar essas pressões. Por isso, quando estamos falando de organismos vivos, o movimento líquido(*) de Oxigênio é o de entrada e o movimento líquido do Gás Carbônico é de saída.
(*) Movimento líquido no sentido de bruto/líquido
Respirar na água e respirar no ar
Como sabemos, existem animais que respiram na água e animais que respiram no ar. Em ambos há oxigênio, mas entre esses ambientes há uma diferença importante na solubilidade do oxigênio.
A solubilidade é a capacidade das substâncias de se dissolverem em um solvente, que pode ser a água ou o ar atmosférico, como nos nossos dois modelos aqui. Existem alguns fatores que interferem na solubilidade, como é o caso da temperatura, como vocês podem conferir no primeiro gráfico ao lado. Ele nos diz que quanto mais quente está a água, menos solúvel é o oxigênio nela. Esse é um dos perigos da poluição térmica, que vimos lá na parte de Pauta Ambiental. Outro fator que altera a solubilidade é a pressão parcial do gás, como é mostrado na segunda figura ao lado. Isto é, quanto maior for a pressão da atmosfera, mais moléculas de gases que a compõem tendem a se chocar com o corpo d'água e, consequentemente, se difundir de um meio a outro. Ou seja, espera-se que em um lago a 2.000 metros de altitude (onde a pressão parcial de O2 é menor) tenha menos oxigênio dissolvido na água do que um lago ao nível do mar, se ambos estiverem à mesma temperatura. Essa é uma síntese da Lei de Henry, que enuncia que a solubilidade de um gás dissolvido em um líquido é diretamente proporcional à pressão parcial do gás acima desse líquido.
Entretanto, a pressão e temperatura não são os únicos fatores que alteram a solubilidade. Presta atenção: constantemente, há a tendência da pressão parcial do O2 na água ser igual à do ar que está logo acima dele, visto que eles realizam trocas e tendem a se equilibrar. Entretanto, a quantidade de O2 dissolvido na água é muito menor, pois a água é apx. 50 vezes mais viscosa e 770 vezes mais densa que o ar, o que diminui o grau de liberdade das moléculas de oxigênio na água, diminuindo sua solubilidade também. Em outras palavras: embora a pressão parcial do oxigênio seja igual na água e no ar, a quantidade de oxigênio dissolvido na água é menor, pois a solubilidade é uma propriedade que depende de outros fatores além da pressão dos meios.
Revista Química Nova na Escola, 2005. Fiorucci & Filho.


Por isso, animais que respiram na água têm de ter estruturas extremamente eficientes de absorção deste gás para compensar sua menor disponibilidade no meio. É comum que a concentração de Oxigênio seja cerca de trinta vezes menor na água do que no ar. Por isso, os animais aquáticos necessitam de muito mais eficiência na absorção do gás, enquanto seres humanos, por exemplo, só absorvem cerca de 25% do oxigênio inspirado. Ocorre, como vocês verão, de alguns animais aquáticos ou semi-aquáticos utilizarem dois meios de respiração combinados.
Superfícies de troca de animais aquáticos: as brânquias

A maioria dos animais que vivem na água possuem brânquias. É claro, você não pode se esquecer das tartarugas (réptil), baleias e golfinhos (mamíferos), que são animais marinhos, mas pulmonados. Mais a frente você vai conhecer até alguns peixes com pulmões. As brânquias são órgãos especializados em respirar na água, isto é, basicamente, um peixe não consegue respirar fora dela com as brânquias. Antes de falar do funcionamento da brânquias, propriamente ditas, gostaria de falar um pouco sobre o porquê seu formato ser do jeito que é. Obra da evolução, é claro. Como falamos anteriormente, as superfícies de trocas gasosas na água necessitam ser muito mais eficientes do que aquelas que trocam gases com a atmosfera. Dessa forma, as brânquias vão ser sempre estruturas finas e largas, como fica claro nas imagens. Isso ocorre em resposta à uma característica da difusão dos gases. Difundir é passar de um meio a outro, tá? As taxas de difusão obedecem à duas máximas: a primeira é que quanto maior a superfície em contato com a água, maior a taxa de difusão; a segunda é que quanto mais células os gases tiverem que transpassar para alcançar a circulação sanguínea, mais difícil será alcançá-la.
Ou seja, sendo finas e largas, a forma das brânquias são a superfície de troca gasosa especializada mais eficiente do reino animal.
Um segundo detalhe que eu quero chamar atenção está no seguinte esquema. Por que o que encontramos é o representado em A e não em B? A resposta para isso está também no que já falamos acima. Com essas ramificações chamadas Lamelas (que lembram muito as vilosidades das células do intestino) se torna maior a área de contato entre as células periféricas e a água, como vamos mostrar mais à frente.


