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Por que dividir em funções vitais?

Todos os seres vivos necessitam realizar suas funções vitais de alguma forma. Até mesmo uma bactéria, unicelular aeróbica, respira, digere e excreta nutrientes, etc. Com tamanhos, complexidades e ambientes tão diferentes, é de se esperar que existam distintas estratégias, adaptadas ao ambiente que vivem. Aqui, vamos conhecer algumas, para que nos lembremos sempre que diversos mecanismos evolutivos estão por trás dessas estruturas e processos metabólicos tão incríveis. 

Há uma relação entre um sistema circulatório especializado e o tamanho dos seres vivos?

Quando pensamos sobre oxigênio, sangue e coração logo nos vêm o nosso sistema circulatório em mente. Para nós, ele tem a importante função de transporte de gases (O2 e CO2) e outras substâncias vitais (células de defesa, glicose, gordura, etc). Para compreendermos a importância de um mecanismo especializado em transporte, vamos observar o seguinte fator: se não for por um sistema de vasos/canais, como mais os gases e essas substâncias poderiam se transportar? A resposta é: por um processo chamado de difusão (célula a célula), como se fosse aquela brincadeira dos “escravos de Jó” ou da “batata quente”. Entretanto, quando estamos falando de animais que possuem 2, 5 ou 10 metros de comprimento e trilhões de células, pensar num fluxo de nutrientes célula a célula é basicamente impossível. Mesmo que exista uma diferença de concentração entre as células vizinhas para impulsionar estas substâncias em favor de um gradiente, esse movimento se torna muito lento e ineficiente pra um indivíduo com mais de alguns milímetros. “O tempo que uma substância leva para 

se difundir de um lugar a outro e proporcional ao quadrado da distância”. Por exemplo, “a quantidade de glicose que leva 1 segundo para difundir-se 100 μm, levará 100 segundos para difundir-se 1 mm e quase 3 horas para difundir-se 1 cm. Essa relação entre tempo de difusão e distância impõe uma restrição significativa ao plano corporal de qualquer animal”. Portanto, agora fica mais fácil entender que os sistemas circulatórios e de transportes de substâncias são adaptações evolutivas que permitiram que as espécies animais e vegetais pudessem se tornar cada vez maiores em tamanho. Mas atenção para não se confundir: o fato de possuir um sistema circulatório, com coração e tal, não significa que o indivíduo tenha que ser grande. Um bom exemplo são os mosquitos, que tem tamanho médio de 1,5 cm e possuem sistema circulatório, como veremos a frente. O que a relação entre restrição de tamanho e sistema circulatório nos mostra é que o transporte de gases e substâncias é tão potencializado por uma rede especializada de condução que isso abre possibilidade para que possam existir mais tecidos, mais complexos, em uma estrutura corporal maior visto que o oxigênio e nutrientes chegarão a praticamente todos os tecidos vivos através da circulação.

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Circulação

As Brófitas (conhecidas como "musgos") são plantas que normalmente têm seu pequeno tamanho atribuído à ausência de sistema condutor. Apesar de algumas espécies possuírem algumas células de condução, elas não se organizam em feixes especializados e sistema como nas pteridófitas, gimnospermas e angiospermas. Observe a foto acima. Os musgos são os que estão formando um tapete verde no chão. Normalmente não passam de 10 cm de comprimento. As árvores desta imagem passam de dez metros de altura, mas temos registros de uma espécie de Gimonsperma que pode chegar a surpreendentes 115 metros: as sequóias-gigantes (Sequoiadendron gigantea). OBS: elas podem chegar a 3 mil anos de idade.

Existem ainda, animais que, mesmo sem um sistema circulatório distinto, conseguem alcançar mais de 10 cm, como alguns cnidários e platelmintos. Como isso é possível? Existem duas principais adaptações que tornam isso possível: a primeira é um plano corporal especializado, onde a grande maioria das células superficiais, que estão em contato direto com o ambiente, conseguem realizar trocas com ele. No mar, onde estes animais invertebrados vivem, existem quantidades consideráveis de material orgânico dissolvido (incluindo aminoácidos, os monômeros das proteínas). também há uma quantidade de oxigênio dissolvido. No caso das Hidras e águas-vivas (espécies de cnidários), elas possuem uma cavidade gastrovascular central para distribuir as substâncias que foram captadas nas células de revestimento da cavidade para todo o corpo. Nos vermes chatos maiores (platelmintos, por exemplo), esta cavidade gastrovascular pode conter ramificações internas para otimizar essa troca (na foto ao lado a cavidade está destacada em amarelo) e o corpo anatomicamente bem achatado também ajuda, pois quanto mais fino, menos camadas de tecidos ele possui, facilitando o alcance destes materiais orgânicos.

Estratégias para otimizar a captação e distribuição de nutrientes e gases

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Tipos de Sistema Circulatório

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Agora que vimos a importância evolutiva dos sistemas circulatórios, vamos entender um pouco melhor no que eles consistem.  Todos os animais que possuem um sistema circulatório contam com três componentes básicos: um líquido circulatório, vasos conectados e uma bomba muscular (coração). Estes três componentes funcionam em conjunto da seguinte forma: “o coração propulsiona a circulação usando a energia metabólica para elevar a pressão hidrostática do liquido circulatório, a pressão que o liquido exerce sobre os vasos circundantes. O líquido então flui pelos vasos [através do corpo do animal] e retorna ao coração”

Estes vasos, em indivíduos maiores, consistem em uma imensa rede ramificada que percorre todas as áreas, mais internas ou mais periféricas, do corpo. Por esse motivo, mesmo que você corte a pontinha do dedo, verá sangue extravasar o vaso em uma pequena e inofensiva hemorragia. Os sistemas circulatórios podem ser abertos (SCA) ou fechados (SCF).

Sistemas Circulatórios Abertos (SCA)

Nos SCA, o liquido circulatório é denominado hemolinfa, pois é também o líquido intersticial que banha as células do corpo; são vistos em artrópodes e alguns moluscos. Nos insetos, o esquema geral do sistema circulatório é o seguinte: um único vaso percorre o dorso do animal, de forma longitudinal (confira na imagem). Este vaso é denominado vaso dorsal. Ele é aberto na sua extremidade próxima à cabeça (região chamada de aorta) e fechado na extremidade próxima ao ânus (região chamada de coração). Através dessa abertura na extremidade da aorta, a hemolinfa abandona o vaso dorsal e cai no grande espaço interno do tórax chamado hemocele

A hemolinfa, ao que a descrição acima dá a entender, circula sob baixa pressão. O coração, bomba muscular que impulsiona a hemolinfa através do vaso dorsal, é constituído por câmaras em série, isto é, que aparecem em sequência. Estas câmaras surgem a partir da tração exercida por músculos alares. Imagine que estas fibras musculares, presas em ambos os lados, puxem, cada parede para um lado, tracionando-as. Espera-se que o espaço interno do vaso aumente, certo? Exatamente neste sentido formam-se câmaras que funcionam como bombas na medida que aumentam e diminuem o espaço interno a partir da ação destes músculos alares, diminuindo e aumentando (respectivamente) a pressão hidrostática para impulsionar a hemolinfa. Quando o coração dilata (movimento de diástole), pela contração desses músculos 

alares, a hemolinfa que está na hemocele é puxada para dentro do coração passando pelos ostíolos, que são pequenas válvulas localizadas lateralmente no coração. Quando o coração contrai (sístole), as válvulas ostiolares se fecham e a pressão aumenta, empurrando o líquido em direção a aorta (e a cabeça do animal).

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Pense bem e responda: quais as vantagens evolutivas de um sistema circulatório fechado em relação a um aberto? Uma dica: pense na separação de ambientes e na pressão sanguínea

Em suma...

Vimos a circulação aberta em artrópodes (incluindo crustáceos, insetos, aracnídeos, etc) e na maioria dos moluscos, excluindo apenas os cefalópodes, como polvos e lulas. Caso não tenha ficado exatamente claro ainda, a circulação aberta tem como principal característica o compartilhamento do fluido que passa dentro dos vasos com o fluido interno do corpo. Na circulação fechada, o sangue só circula dentro dos vasos sanguíneos.

Os moluscos podem ser encontrados no mar (p.ex. polvos), na água doce (p. ex. bivalves) e no ambiente terrestre (p.ex. caramujos, lesmas). No caso daqueles aquáticos, obtém o oxigênio pela hematose branquial (isto é, através das brânquias); no caso dos terrestres, pela hematose pulmonar. Os moluscos já possuem bastantes funções internas concentradas em sistemas especializados. Possuem pulmões/brânquias, rins, coração, intestino, órgãos sensoriais, órgãos reprodutores (pênis e vagina), etc. Quando se trata da circulação, como já adiantamos no título: a maioria possui um sistema aberto (as exceções são os cefalópodes, grupo das lulas e polvos). Isso significa que eles também possuem uma hemolinfa que circula em baixa pressão. O coração dos moluscos possui duas aurículas e um único ventrículo e funcionam da seguinte forma, nos aquáticos, essas aurículas drenam o sangue a 

partir de cada brânquia (Gill, em inglês) através de vasos eferentes e depois passa para o ventrículo, que com força muscular, bombeia o sangue para a aorta única, que fica na porção anterior do animal (isto é, “próximo à cabeça”). No esquema ao lado, é o que está com cor vinho. Perceba que depois do coração (Heart) o vaso leva o sangue para uma abertura anterior também, assim como nos insetos, fazendo com que a hemolinfa caia na hemocele, na massa visceral ("Visceral Mass").

Lula e o polvo

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Alguns moluscos também possuem sistema circulatório aberto

Ter um sistema circulatório aberto é ruim, pior ou mais primitivo?

Se essa pergunta passou pela sua cabeça, fica uma dica: não use esses termos para definir nada quando se trata de evolução. Cada espécie animal possui uma estrutura diferente, que está diretamente relacionada com a sua forma de vida. As espécies não-extintas mais antigas do mundo, com 2,5 bilhões de anos de idade, são as Cianobactérias. Elas consistem em indivíduos unicelulares, resistentes, amplamente distribuídas, se reproduzem assexuadamente, têm uma taxa de mutação extremamente baixa e uma alta tolerância a ambientes extremos. Essas são as principais características que garantiram sua sobrevivência a todas as três grandes extinções em massa que a Terra viveu. Então, embora a reprodução assexuada, por exemplo, tenha surgido antes da reprodução sexuada, não quer dizer que ela é "pior", "desvantajosa", etc. Ela, pelo contrário, foi/é uma característica importante para a sobrevivência das cianobactérias através do tempo geológico da Terra.

Seja reprodução sexuada ou assexuada, circulação fechada ou aberta, cada sistema oferece vantagens evolutivas. Por exemplo: "As pressões hidrostáticas mais baixas, geralmente associadas aos sistemas circulatórios abertos, os tornam menos dispendiosos do que os sistemas fechados em termos de. gasto de energia. Em alguns invertebrados, os sistemas circulatórios abertos têm algumas funções adicionais: as aranhas, por exemplo, utilizam a pressão hidrostática gerada pelo seu sistema circulatório aberto para estender suas pernas". Ou seja, todo ser vivo possui um conjunto de características que o permitem viver e competir no ambiente e no tempo que se encontra. Essas características podem sofrer mudanças e quando assim forem, são positiva ou negativamente selecionadas pelo ambiente.

O Sistema Circulatório Fechado (SCF)

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Todos os vasos sanguíneos (artérias, veias e capilares) de uma mão humana adulta. Nas pontas dos dedos vemos o chamamos de leito ou rede capilar.

Os anelídeos (p. ex. minhocas), cefalópodes e todos os vertebrados possuem um sistema circulatório fechado. Nesse caso, o sangue flui apenas dentro dos vasos sanguíneos. Em relação aos humanos, se considerarmos um homem adulto, a extensão total dos vasos sanguíneos é suficiente para dar duas voltas na Terra pela linha do equador. O sangue, como nos animais de circulação aberta, só flui em um sentido e possui diversos mecanismos para garantir isto. Os principais tipos de vasos sanguíneos são as artérias, veias e capilares. As primeiras transportam sangue do coração para os órgãos, as segundas, dos órgãos para o coração. É importante salientar esta diferença pois é muito comum vermos as pessoas dizendo que as artérias carregam sangue rico em oxigênio e as veias, pobre em oxigênio, mas isso nem sempre é verdadeiro. Elas se diferenciam pela direção que transportam o sangue. Normalmente, nos esquemas e desenhos as artérias são representadas em azul, por transportar o sangue para longe do coração; as veias, em vermelho, por transportar o sangue em direção ao coração. As artérias e veias costumam ser bem calibrosas e ir se ramificando cada vez mais (artérias para arteríolas; veias para vênulas), para se espalhar para o corpo todo (dividir para conquistar!), tornando-se cada vez mais delgadas. Os capilares são, portanto, vasos microscópicos com paredes muito delgadas e porosas. Desta forma, os capilares conseguem chegar a todos os tecidos do nosso corpo (se você for no espelho agora e olhar a parte branca do seu olho, a esclerótica, vai perceber vários capilares que irrigam os seus tecidos oculares). 

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Outra rede de capilares também muito importante é aquela que envolve os alvéolos pulmonares, que através das suas finíssimas paredes (com espessura de apenas uma camada de células, apenas) permite a rápida passagem de gases do interior dos alvéolos para a corrente sanguínea. Os capilares podem ser destruídos e reconstituídos a todo o momento no nosso corpo, uma vez que em diversas situações estes vasos microscópicos podem "estourar". Isso pode ser por vias de uma doença, inflamação, alta pressão sanguínea, alta pressão atmosférica, trauma local ou vários outros motivos. 

Quando você dá uma pancada muito forte e fica roxo, essa coloração na pele é devida a uma pequena hemorragia interna local causada pelo trauma. A conjuntivite, por exemplo, pode levar uma inflamação forte na conjuntiva do olho, fazendo alguns capilares estourarem, deixando o olho com aparência de "bola de sangue". Claro que, depois de tratada, o sangue é reabsorvido e a rede capilar se regenera integralmente. Nos vertebrados vemos dois esquemas de circulação fechada: simples e dupla. A diferença reside, basicamente, na quantidade de vezes que o sangue passa pelo coração durante um circuito completo. Na simples, vista na maioria dos peixes, o sangue passa pelo coração apenas uma vez: do coração para as brânquias e, em seguida, para os tecidos sistêmicos e de volta ao coração. Nos outros vertebrados (mamíferos, aves, répteis e anfíbios), vemos a circulação dupla. Onde o sangue passa duas vezes no coração a cada circuito: o sangue sai do coração para os pulmões para serem oxigenados, voltam ao coração (1ª) para que ele bombeie o sangue oxigenado para os tecidos sistêmicos; depois de oxigenar os tecidos, o sangue volta ao coração (2ª) pobre em oxigênio, para ser bombeado aos pulmões novamente. A diferença é que na circulação dupla é adicionado um circuito menor chamado de circuito pulmonar ou pequena circulação.

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No caso da circulação dos anfíbios o 'circuito pulmocutâneo' é assim chamado pelo fato deste grupo de animais respirar também pela pele! Esse é o motivo pelo qual, aliás, é tão cruel jogar sal nos sapos: eles precisam ter a pele úmida para difundir os gases (O2 e CO2). O sal faz a pele desidratar e o animal morre por asfixia e desidratação.

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Em termos evolutivos, a diferenciação entre o circuito pulmonar/ pulmocutâneo do circuito sistêmico é um fator importante para a adaptação dos animais à vida terrestre. Que outras adaptações você consegue pensar? Pense na pele, na reprodução, etc.

Tem curiosidade sobre como ocorre a respiração dentro da água a partir de brânquias? Lá em baixo, na parte de respiração vamos explicar! Enquanto isso, veja aqui como se organiza num peixe, a sua circulação simples. Claro que esse é um esquema simplificado, e que existem muito mais vasos se ramificando e percorrendo o corpo do animal!

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Primeiro é preciso salientar que é muito difícil generalizar “coração do anfíbio”, “coração do réptil” pois dentro deste grande grupo existem diferenças muito fortes, que não podem ser ignoradas. No caso dos anfíbios, temos espécies que utilizam respiração cutânea, branquial e pulmonar, e isso, evidentemente, traz mudanças no esquema circulatório. Feita esta observação, entendam que as descrições feitas a seguir podem não abarcar todos os animais do grupo e sim o modelo ou a maioria.

Quando falamos de câmaras do coração, estamos falando de câmaras musculosas que se enchem de sangue quando se expandem e impulsionam o sangue quando se contraem. Estes movimentos são chamados de diástole e sístole, respectivamente. As câmaras podem ter dois nomes dependendo da sua função: átrios e ventrículos. Normalmente os átrios são menores que os ventrículos, e trabalham recebendo o sangue. Os ventrículos, por sua vez são maiores e normalmente bem musculosos, sendo o responsável pela força de impulsionamento do sangue que vai percorrer todo o corpo. Normalmente, o coração possui diversas válvulas, nas conexões entre vasos e câmaras e também entre câmaras, para evitar o refluxo de sangue. Isso é importante para garantir que o sangue só flua em uma direção.

 

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As aves e mamíferos possuem quatro câmaras, fazendo o circuito duplo ser completo e totalmente eficiente no sentido de separação do sangue rico e pobre em oxigênio. “Diferentemente dos anfíbios e muitos répteis, as aves e mamíferos, não podem variar o fluxo sanguíneo para os pulmões sem variá-lo por todo o corpo em paralelo”. Isso, embora reduza a resistência à interrupção na respiração, fornece uma alta eficiência no fornecimento de oxigênio para os tecidos, visto que não há mistura no coração. Esse é um importante fator para estes animais uma vez que eles são endotérmicos, isto é, mantém a sua temperatura através da energia metabólica e não do ambiente (eu explico isso em uma postagem lá do Blog). Deste modo, endotérmicos têm que gastar cerca de dez vezes mais energia que um ectotérmico de tamanho equivalente. Por isso, uma alta eficiência no transporte de gases garante uma também eficiente produção de energia nas células.

O coração da maioria dos peixes consiste em um coração tubular, no formato de “S”, que possui quatro cavidades de contração sequencial: seio venoso, átrio, ventrículo e bulbo arterial (alguns autores interpretam o bulbo arterial como parte do ventrículo). Apenas para ressaltar, no esquema ao lado o coração do peixe não está em formato de S, pois está planificado, "retão", mas é só um esquema. O mais semelhante ao formato original é aquele onde tem um peixe e o sistema completo (ali em cima), Entre as câmaras do coração desses peixes, existem válvulas também para coordenar o fluxo. O seio venoso e o átrio possuem paredes delgadas, diferente do ventrículo, de paredes espessas, responsável pela força de propulsão de saída do sangue do coração. O sangue que passa pelo coração dos peixes, que possuem circulação simples, como já dito anteriormente, é pobre em oxigênio.

O coração dos peixes pulmonados, anfíbios e répteis possuem adaptações à circulação dupla, que consistem basicamente numa divisão maior entre as câmaras, visto que agora circula sangue rico e pobre em oxigênio, simultaneamente, no coração destes animais. Em algumas condições, como vou explicar mais a frente, pode haver mistura destes sangues. Nas rãs e outros anfíbios encontramos três câmaras (dois átrios e um ventrículo). Nos répteis, encontramos grupos com três câmaras (tartarugas, serpentes e lagartos) e com quatro (crocodilianos). A diferença entre eles es tá mais no septo ventricular. Isto é, nos grupos que possuem três câmaras, este septo é incompleto, permitindo passagem de sangue para um lado e para o outro. Por isso, neste caso, consideramos o ventrículo como único. Nos grupos que possuem quatro câmaras esse septo é completo, separando bem os ventrículos em esquerdo e direito.

Existe uma questão muito importante a ser comentada em relação às câmaras. Alguns vertebrados são semi-aquáticos, como os anfíbios e alguns répteis. Muitos deles podem passar longos períodos embaixo d’água, apesar de possuírem pulmão. O que pode ocorrer é que eles enchem o pulmão de ar e conseguem passar longos períodos sem trocas gasosas. No caso das rãs e alguns outros anfíbios, vemos três câmaras: dois átrios e um único ventrículo. O sangue rico em oxigênio que chega do circuito pulmocutâneo entra no coração pelo átrio esquerdo, certo? Se ficar confuso, consulte a imagem acima ou abaixo. Do átrio esquerdo, o sangue passa para o ventrículo único. Lá, um sulco vai desviar cerca de 90% do sangue oxigenado para o circuito sistêmico e a maior parte do sangue desoxigenado para o circuito pulmocutâneo. Tá acompanhando? Isto é, mesmo não havendo uma divisão no ventrículo, a maior parte do sangue oxigenado vai pros tecidos sistêmicos e a maior parte do desoxigenado vai para o circuito pulmocutâneo sofrer hematose (receber oxigênio). Mas eu disse “a maior parte”, certo? E os outros 10, 15%? Lembra que eu falei que quando alguns animais semi-aquáticos passam um tempo dentro da água, seus pulmões cessam temporariamente a atividade? Se o circuito pulmocutâneo fosse totalmente fechado pela interrupção da atividade do pulmão, toda a circulação pararia e o animal morreria. Graças a esta divisão incompleta do ventrículo, a fisiologia do animal se ajusta ao período de nado, fechando a maior parte do fluxo de sangue para os pulmões por algum tempo. Isso faz com que o circuito pulmocutâneo não pare, mas diminua drasticamente o seu fluxo sanguíneo. No caso das tartarugas, serpentes e lagartos, possuem um coração com septo incompleto, que vai funcionar mais ou menos como explicamos acima. Pense na tartaruga marinha, que nada por 15 a 30 minutos totalmente submersa (algumas espécies conseguem bem mais). Ela se movimenta bem lentamente, consequência de um fenômeno chamado bradicardia (diminuição significativa dos batimentos do coração). Desta forma, durante o período de apneia, a demanda de oxigênio diminui muito, uma vez que a demanda de energia nos tecidos também diminui. “Nos crocodilos, jacarés e outros crocodilianos, os ventrículos são divididos por um septo completo, mas os circuitos pulmonar e sistêmico se conectam pelas artérias à saída do coração. Essa conexão permite que as válvulas arteriais desviem o fluxo sanguíneo temporariamente para longe dos pulmões, como quando o animal está debaixo d’água”.

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Resumo

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Evolução das câmaras do coração nos Vertebrados

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Esse é um esquema que resume todo o fluxo circulatório, mas gostaria de chamar atenção para alguns detalhes:

1 - Perceba que há uma cor roxa no meio das rede de capilares. Essa cor tá indicada ali na legenda e também explicada nos textos acima da legenda. Entender isso é chave para entender a dinâmica de circulação.

2 - Perceba como os ventrículos (VD e VE) são muito mais musculosos que os átrios (AE e AD). Já falamos disso lá em cima!

3 - Perceba que existe uma veia chamada "porta-hepática". Ela faz parte da circulação porta, que liga por meio de vasos sanguíneos o fígado com os órgãos do sistema digestivo (estômago e intestinos). Isso ocorre pois uma das funções do fígado é de controle do açúcar no sangue (glicemia) e já que ele é obtido através da alimentação, faz sentido que os órgãos digestivos e o fígado sejam conectados.

4 - Perceba que a definição que demos de artéria e veia (lá em cima) é a mais segura pra você não se confundir: a artéria leva o sangue para longe do coração e as veias, em direção ao coração. Mas porque você se confundiria? Por que se você guardar que as artérias levam sangue rico em oxigênio e as veias, pobre, como acontece na circulação sistêmica, você vai errar quando tentar aplica isso à circulação pulmonar. Nela, a artéria pulmonar que leva o sangue desoxigenado para sofrer hematose no pulmão. Depois, esse sangue oxigenado volta ao coração através da veia pulmonar. Ou seja, "inverte", né? Mas na verdade nada se "inverte", é tua perspectiva que tem que ser outra. As artérias levam o sangue para longe do coração e as veias, em direção ao coração. Sempre.

No modelo 3D ao lado, é importante reparar no funcionamento de válvulas e na questão do ritmo cardíaco. O coração é o único órgão que possui musculatura estriada que atua de forma involuntária. Por isso existe uma distinção entre músculo estriado esquelético (aquele associado aos ossos) e músculo estriado cardíaco (que compõe o coração). O esquelético é uma musculatura predominantemente voluntária, enquanto a cardíaca é involuntária. O batimento cardíaco é coordenado por impulsos nervosos altamente ritmados formando o que chamamos de ciclo cardíaco, isto é, o batimento atrial e ventricular denominados sístole e diástole. Quando o coração bate fora do ritmo, há o que chamamos de arritmia. Quando o coração não recebe ou não responde corretamente aos impulsos nervosos de contração, ele pode fibrilar. Na impressão de qualquer pessoa que assiste um coração fibrilando, a descrição correta seria o coração "tremendo". Essa perda total do ritmo cardíaco pode ser revertida com massagem cardíaca ou com um aparelho chamado desfibrilador, que através de uma corrente elétrica determinada, pode ser capaz de reaver o ritmo cardíaco compatível com a vida.

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Ao lado podemos ver um esquema que coloca uma perspectiva evolutiva dessas modificações nos sistemas circulatórios simples e duplos. Se já é praticamente impossível separar o funcionamento de todos sistemas de um organismo, é mais difícil ainda separar o funcionamento dos sistemas cardíaco/circulatório do respiratório. Vocês vão conhecer mais nuances dos sistemas respiratórios abaixo.

Para uma correta interpretação da imagem, considere o cinza claro como sangue oxigenado e o cinza escuro como sangue desoxigenado.

Respração

RESPIRAR

A respiração, assim como o batimento de um coração, são daqueles eventos na biologia que duram alguns milésimos ou segundos e demoramos décadas para entender e horas para explicar. Já parou pra pensar como um inseto respira? E uma planta? uma estrela do mar? um peixe? uma tartaruga? uma aranha? Você tem certeza que todos eles respiram, mas como? Aqui vamos explorar a respiração comparada, que também tem preceito evolutivo e total relação com a forma de vida da espécie. No vídeo ao lado você pode notar pequenas bolhas, que consistem nos gases gerados no metabolismo vegetal (fotossíntese e respiração).

Ah, só mais uma coisa: essa abordagem comparada que eu trago é bem complexa de montar, pois envolve uma seleção muito criteriosa de quais detalhes vão entrar na narrativa que eu trago a vocês. Claro que eu gostaria de passar semanas escrevendo sobre todas as formas variadas e particulares de respiração de cada grupo, de cada espécie, mas eu preferi (por razões práticas e didáticas) fazer um apanhado bem resumido das principais formas respiratórias pra traçar um panorama evolutivo geral da relação entre as formas de vida e o O2/CO2

Vídeo produzido pelo Laboratório de Ecologia e Dinâmica Bêntica Marinha - UERJ

Por que os gases passam de um ambiente a outro?

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A partir de agora vamos falar apenas de organismos aeróbicos e vamos trocar o nome "respiração" por "troca de gases", pois respiração pode confundi-los com o processo bioquímico "respiração celular" e nós não vamos abordar esse processo nessa seção. Então, respondendo a pergunta: a troca de gases entre um organismo vivo e a atmosfera ocorre por conta da diferença de pressão parcial entre os ambientes. Essa frase, apesar de simples, demanda que você conheça alguns conceitos, que vamos facilitar a seguir:

1) Que gases são esses?

No caso estamos tratando dos gases envolvidos na respiração, que são gás oxigênio (O2) e gás carbônico ou dióxido de carbono (CO2).

 

2) O que é pressão de um gás?

Pressão é a força de colisão de partículas gasosas contra as paredes de um recipiente. Olhe o primeiro gif ao lado. Nos dois recipientes há a mesma quantidade de mols e a mesma temperatura, o que os diferencia é o volume. Com maior espaço interno, isto é, maior volume (primeiro recipiente) as moléculas se chocam com menos frequência com as paredes, logo a pressão é menor. No segundo recipiente, o fato de haver menos espaço de movimentação faz com que as moléculas colidam com mais frequência contra as paredes do recipiente, logo, a pressão é maior. A temperatura também pode alterar a pressão, na medida que deixa as moléculas mais agitadas. Observe no segundo gif. A única diferença entre os recipientes é a temperatura, pois ambos tem o mesmo número de mols e o mesmo volume. A temperatura, portanto, aumenta a agitação das moléculas, aumentando também a força de colisão com as paredes do recipiente, logo, a pressão é maior. A última variável é a quantidade de mols. Se em dois recipientes de volumes e temperatura iguais, um tiver mais moléculas que outro, certamente a força de colisão será maior, logo, a pressão também será maior. Essas três variáveis -volume, quantidade de mols e temperatura- são justamente as componentes da fórmula para cálculo de pressão de um gás, exposto na figura ao lado. OBS: R não é uma variável, é uma constante.

3) Por que chamamos de pressão parcial (pp)?

Porque estamos admitindo que o O2 e o CO2 fazem parte de uma mistura de gases. A atmosfera é um excelente exemplo de mistura de gases. Nela, existem diversas moléculas gasosas, como N2, O2, O3, CO2, CH4, CFC, etc. Cada uma está em uma determinada concentração, exercendo uma pressão parcial que contribui com determinada porcentagem para a pressão atmosférica (total). A pressão parcial de um gás seria a contribuição da pressão desse gás para pressão total da mistura. Logo, a pressão total é a soma das pressões parciais de todos os gases que a compõem a mistura.

Então, quando um gás possui diferença de pressão entre dois ambientes, a tendência é ocorrer a passagem de partículas de um para outro para equilibrar essas pressões. Por isso, quando estamos falando de organismos vivos, o movimento líquido(*) de Oxigênio é o de entrada e o movimento líquido do Gás Carbônico é de saída.
(*) Movimento líquido no sentido de bruto/líquido

Respirar na água e respirar no ar

Como sabemos, existem animais que respiram na água e animais que respiram no ar. Em ambos há oxigênio, mas entre esses ambientes há uma diferença importante na solubilidade do oxigênio.

A solubilidade é a capacidade das substâncias de se dissolverem em um solvente, que pode ser a água ou o ar atmosférico, como nos nossos dois modelos aqui. Existem alguns fatores que interferem na solubilidade, como é o caso da temperatura, como vocês podem conferir no primeiro gráfico ao lado. Ele nos diz que quanto mais quente está a água, menos solúvel é o oxigênio nela. Esse é um dos perigos da poluição térmica, que vimos lá na parte de Pauta AmbientalOutro fator que altera a solubilidade é a pressão parcial do gás, como é mostrado na segunda figura ao lado. Isto é, quanto maior for a pressão da atmosfera, mais moléculas de gases que a compõem tendem a se chocar com o corpo d'água e, consequentemente, se difundir de um meio a outro. Ou seja, espera-se que em um lago a 2.000 metros de altitude (onde a pressão parcial de O2 é menor) tenha menos oxigênio dissolvido na água do que um lago ao nível do mar, se ambos estiverem à mesma temperatura. Essa é uma síntese da Lei de Henry, que enuncia que a solubilidade de um gás dissolvido em um líquido é diretamente proporcional à pressão parcial do gás acima desse líquido.

Entretanto, a pressão e temperatura não são os únicos fatores que alteram a solubilidade. Presta atenção: constantemente, há a tendência da pressão parcial do O2 na água ser igual à do ar que está logo acima dele, visto que eles realizam trocas e tendem a se equilibrar. Entretanto, a quantidade de O2 dissolvido na água é muito menor, pois a água é apx. 50 vezes mais viscosa e 770 vezes mais densa que o ar, o que diminui o grau de liberdade das moléculas de oxigênio na água, diminuindo sua solubilidade também. Em outras palavras: embora a pressão parcial do oxigênio seja igual na água e no ar, a quantidade de oxigênio dissolvido na água é menor, pois a solubilidade é uma propriedade que depende de outros fatores além da pressão dos meios. 

Revista Química Nova na Escola, 2005. Fiorucci & Filho. 

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Por isso, animais que respiram na água têm de ter estruturas extremamente eficientes de absorção deste gás para compensar sua menor disponibilidade no meio. É comum que a concentração de Oxigênio seja cerca de trinta vezes menor na água do que no ar. Por isso, os animais aquáticos necessitam de muito mais eficiência na absorção do gás, enquanto seres humanos, por exemplo, só absorvem cerca de 25% do oxigênio inspirado. Ocorre, como vocês verão, de alguns animais aquáticos ou semi-aquáticos utilizarem dois meios de respiração combinados.

Superfícies de troca de animais aquáticos: as brânquias

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A maioria dos animais que vivem na água possuem brânquias. É claro, você não pode se esquecer das tartarugas (réptil), baleias e golfinhos (mamíferos), que são animais marinhos, mas pulmonados. Mais a frente você vai conhecer até alguns peixes com pulmões. As brânquias são órgãos especializados em respirar na água, isto é, basicamente, um peixe não consegue respirar fora dela com as brânquias. Antes de falar do funcionamento da brânquias, propriamente ditas, gostaria de falar um pouco sobre o porquê seu formato ser do jeito que é. Obra da evolução, é claro. Como falamos anteriormente, as superfícies de trocas gasosas na água necessitam ser muito mais eficientes do que aquelas que trocam gases com a atmosfera. Dessa forma, as brânquias vão ser sempre estruturas finas e largas, como fica claro nas imagens. Isso ocorre em resposta à uma característica da difusão dos gases. Difundir é passar de um meio a outro, tá? As taxas de difusão obedecem à duas máximas: a primeira é que quanto maior a superfície em contato com a água, maior a taxa de difusão; a segunda é que quanto mais células os gases tiverem que transpassar para alcançar a circulação sanguínea, mais difícil será alcançá-la.

Ou seja, sendo finas e largas, a forma das brânquias são a superfície de troca gasosa especializada mais eficiente do reino animal.

Um segundo detalhe que eu quero chamar atenção está no seguinte esquema. Por que o que encontramos é o representado em A e não em B? A resposta para isso está também no que já falamos acima. Com essas ramificações chamadas Lamelas (que lembram muito as vilosidades das células do intestino) se torna maior a área de contato entre as células periféricas e a água, como vamos mostrar mais à frente.

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Mesmo ocupando uma pequena parte do corpo do animal, o que varia entre as espécies, como você pode ver ao lado, é comum que a superfície de absorção das brânquias seja maior do que a totalidade da superfície externa do animal.

Aequipecten irradians, um molusco bivalve.

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Brânquias de Peixe

Como funcionam as brânquias

Toda respiração necessita de ventilação. Podemos entender como ventilação o ato de "irrigar" a superfície de troca gasosa (branquias, pele ou pulmão) com o meio que contém o gás dissolvido (água ou ar). No caso das brânquias, ventilação é o ato de produzir uma corrente de água por entre as lamelas; no caso dos pulmões, ventilar é encher os alvéolos pulmonares de ar atmosférico. Diferentes organismos produzem essa corrente de água de diferentes formas. Alguns animais têm cílios que batem continuamente fazendo a água se movimentar em volta dele, outros ventilam com o sistema de propulsão, como polvos e lulas; outros, como muitos peixes, usam o sistema contracorrente. O sistema tem esse nome por que o peixe absorve água pela boca e devolve para o mar pelas brânquias, fazendo com que a água flua num sentido oposto ao do sangue. Isso é extremamente eficiente pois em qualquer ponto de contato dessa água com os capilares, o sangue será menos concentrado em O2 do que a água. Isso faz com que a troca ocorra mesmo que o sangue já esteja com uma concentração boa de oxigênio, saturando completamente o sangue. Observe na imagem abaixo, no quadro de "Troca por contracorrente". A água encontra primeiro o sangue rico em O2

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(em vermelho), mas ela está ainda mais rica, então ocorre difusão. Depois, a água vai perdendo O2 para o sangue, mas vai encontrando um sangue cada vez menos oxigenado (em azul) no seu fluxo. Portanto, em cada ponto da sua trajetória, o sangue é menos saturado de O2 do que a água que ele encontra. 

O motivo pelo qual essa troca acontece, como você já aprendeu lá em cima, é pela diferença de pressão parcial de oxigênio (ppO2) nos dois meios (água e sangue). O oxigênio passa do meio com maior pressão para aquele que possui menor pressão (da água para o sangue). A lei que coordena isso é a da entropia, como já expliquei em um post lá no Blog.

Calmaí, rapidinho...

Antes de partir para a respiração nos animais terrestres, tenho duas considerações a fazer pra fechar aqui com chave de ouro. A primeira é "sabendo que os animais terrestres surgiram a partir de animais aquáticos, como e quando se originaram os pulmões?" E a segunda é "como animais com pulmões respiram dentro d'água? Vamos ver, com mais detalhes, cada um desses dois pontos.

Mamíferos, répteis e aves pulmonados em baixo d'água

Como será que baleias, golfinhos, tartarugas, focas, pinguins ou o iguanas-marinhas conseguem viver em baixo d'agua? Fazendo a mesma coisa que você: prendendo a respiração. Mas claro, que, ao passo que você fica no máximo 2 minutos em baixo d'água e já sai se achando o rei da savana, os organismos dos animais que eu citei acima são adaptados para prender a respiração por muito mais tempo, como vinte minutos a sete horas. O ato de prender a respiração tem o nome bonito de "apneia", que vamos usar daqui pra frente, tá?

Observe o vídeo ao lado. Ele conta um pouco da história das iguanas-marinhas (Amblyrhynchus cristatus). São do grupo dos répteis, que são, em sua maioria, ectotérmicos. Isso significa que esses animais não conseguem produzir calor internamente pra manter a homeotermia do corpo em relação ao ambiente, necessitando de estratégias comportamentais para tal. Daí que vem o "banho de sol"

O vídeo explica que o meio terrestre, pobre em alimento, obrigou essas iguanas a irem buscar recursos no fundo do mar na costa gelada de Galápagos. Repare em adaptações interessantes desse animal: as garras bem fortes para se prender às pedras, visto que há uma correnteza muito forte na costa; os dentes bem alinhados pra conseguir comer as algas grudadas na rocha; e algo muito importante: a capacidade de apneia de até uma hora.

Entretanto, além da limitação de ter que voltar à superfície para respirar, as iguanas-marinhas não podem ficar tempo demasiado nas águas geladas sob o risco de morrerem. Esse risco existe por serem ectotérmicas, isto é, a sua temperatura corporal varia de acordo com a temperatura do ambiente à sua volta. Se ficarem muito tempo submersas, seu corpo pode ficar tão gelado que os seus músculos paralisam, impedindo que ela nade de volta à superfície e acabe morrendo afogada.

As tartarugas-de-couro (Dermochelys coriacea) são os únicos répteis parcialmente capazes de produzir calor no próprio corpo. Os outros répteis adotam de estratégias comportamentais para controlar a temperatura corporal. Em relação à respiração, que é o foco aqui, temos algumas questões a considerar sobre as tartarugas-marinhas. Elas possuem pulmões grandes e fazem uma respiração explosiva, isto é, muito rápida.

Passam a maior parte da vida embaixo da água e emergem somente para respirar. O único momento que saem é para colocar os ovos na areia, mas assim que o fazem, voltam para a água. As tartarugas são os répteis mais antigos atualmente vivos e, ao que todo estudo na área indica, são oriundas de animais terrestres que adquiriram hábito aquático. Com o passar do tempo, suas patas foram se modificando em nadadeiras e sua capacidade de apneia aumentou. Apesar de terem uma grande capacidade de apneia, quando são impedidas de emergir, como quando estão presas em redes de pesca, acabam morrendo afogadas. Sua capacidade de apneia varia entre as especies e entre o estado do animal. Quando está dormindo, pode ficar entre 5 e 7 horas submersa, já que seu metabolismo -que já é lento- fica ainda menos exigente em termos energéticos, ou seja, demanda menos oxigênio.

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Os mamíferos, como baleias e golfinhos também possuem pulmão. Cada espécie de baleia e golfinho consegue sustentar uma determinada apneia. A baleia cachalote, por exemplo, consegue ficar até uma hora e meia sem respirar. Isso é muito importante, pois ela come, dentre outras coisas, lulas que nadam em mares mais profundos. Uma apneia duradoura a ajuda a mergulhar profundamente sem necessidade de voltar de forma tão rápida à superfície. Filhotes dessa espécie têm dificuldade de fazê-lo e vão ganhando capacidade de apneias mais longas conforme vão envelhecendo. Então, é comum que as mães deixem seus filhotes na superfície enquanto vão se alimentar em regiões mais profundas. Os golfinhos não tem uma capacidade tão grande de apneia, sendo, no máximo 20 minutos. Esse é o motivo pelo qual não vemos esses animais nadando de forma muito profunda, sendo frequentemente vistos nadando com as barbatanas para fora ou saltando por aí. A capacidade de apneia desses animais  está sendo estudada e ao que tudo indica, têm a ver com a alta concentração da proteína mioglobina nos tecidos musculares desses animais. Assim como a hemoglobina, a mioglobina possui moléculas de Ferro que carregam o oxigênio, o que dá a cor vermelha. Por esse motivo a "carne" de golfinho e de baleia é praticamente preta. A mioglobina tem uma afinidade muito maior que a hemoglobina ao oxigênio, o que vamos explorar mais a frente. Por isso, muitos tecidos nesses animais podem funcionar como reservas de gás oxigênio adquirido no momento que eles emergem.

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Protopterus, um peixe pulmonado com pulmões desenvolvidos, capaz de respirar ar.

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Electrophorus, a enguia-elétrica, que engole ar e absorve oxigênio pela mucosa oral

Os peixes e os primeiros pulmões

Dentre os muitos desafios da conquista da terra firme pelos animais vertebrados (ex. ressecamento da pele e locomoção), está a respiração. O conjunto mais complexo de mudanças ambientais, anatômicas e fisiológicas sobre esse evento eu vou dispor em breve numa postagem do blog. Mas aqui quero falar especificamente sobre a Bexiga Natatória. Nos peixes ósseos, os osteíctes, existe uma bolsa de ar que permite a esses animais controlar sua flutuabilidade dentro da água, fazendo com que ele não precise nadar frequentemente. Durante muito tempo se acreditou que a bexiga natatória seria uma espécie de pulmão primitivo, mas hoje sabemos que os pulmões surgiram primeiro, sendo a bexiga natatória uma derivação dos primeiros pulmões. A bexiga natatória pode, em algumas espécies, servir como um órgão auxiliar de respiração, nesse caso recebendo o nome de bexigas respiratórias de gás. Os mais atuais achados fósseis mostram com um bom grau de certeza que os primeiros pulmões surgiram em peixes, provavelmente no ancestral dos actinopterígios e sarcopterígios (grupos de peixes ósseos). Nenhum peixe cartilaginoso (como os tubarões e arraias) tem pulmão ou bexiga natatória. As evidências mais atuais indicam a probabilidade de diversas reversões evolutivas terem ocorrido envolvendo bexigas natatórias e pulmões nos peixes ósseos (onde a característica  surgiu), isto é, sobre a função de flutuação e respiração. Os pulmões evoluíram para bexigas natatórias não respiratórias que, em processos evolutivos subsequentes, se reverteram para bexigas respiratórias de gás.

Fato é que hoje em dia, temos dados de diversos peixes que possuem ou pulmões ou bexigas respiratórias, como é o caso do grupo dos Dipnoicos (conhecidos também por peixes pulmonados). Também há peixes que utilizam a respiração aérea como complementar à branquial, como é o caso da enguia-elétrica (Electrophorus) e do bagre (Hoplosternum). A enguia, por exemplo, engole ar e a mucosa da sua boca absorve o oxigênio. Em alguns peixes, inclusive, as brânquias são usadas para respiração aérea, como é o caso do peixe Mnierpes. No caso dele, suas brânquias são reforçadas para não se colapsarem ou ressecarem em contato com o ar, o que normalmente acontece nas brânquias de outros animais.

O que quero dizer com esse quadro aqui é que além dos pulmões terem sido originados nos peixes, esse órgão foi primordial para a conquista da terra firme pelos peixes ancestrais dos anfíbios. Os pulmões foram ganhando muitas especializações e sendo moldados pela evolução para ser cada vez mais eficiente na ventilação aérea, como vamos ver a seguir.

Gente, antes uma consideração que não podemos ignorar acerca dos peixes ósseos e as bexigas natatórias. Como o esqueleto desses peixes é predominantemente ósseo, isso os torna bem densos. Por isso, quase todos os osteíctes possuem algum tipo de bexiga de gás ou pulmão. Quando preenchidos por gás, melhoram a flutuabilidade do animal, ajudando-o a resistir a essa tendência de afundar. Eu falo disso numa postagem lá do Blog. Não deixa de conferir.

Anfíbios: vida dupla e a dupla respiração

Os anfíbios são um grupo "de transição" entre o meio aquático e terrestre. Como já falamos um pouco lá em cima, a maioria dos anfíbios possuem dois tipos de respiração: pulmonar e cutânea. Vamos abordar primeiro a cutânea, depois falar dos pulmões dos anfíbios para seguir com os pulmões em outros grupos animais

Respiração cutânea

Sempre que falamos de respiração cutânea vêm na cabeça os anfíbios, mas a primeira coisa que quero ressaltar aqui é que espécies de diversos grupos utilizam respiração cutânea como um mecanismo auxiliar. Somente um grupo de anfíbio utiliza a respiração cutânea como único meio respiratório, que é a família Plethodontidae, cujo membro mais conhecido é a salamandra-sem-pulmão (Ensatina eschsholtzii). Essas espécies não possuem pulmão nem brânquias, respirando exclusivamente através da pele. De resto, temos diversos exemplos de peixes, répteis, aves e até mesmo mamíferos que realizam respiração cutânea de forma secundária. Morcegos, por exemplo, eliminam até 12% do dióxido de carbono pelas finas membranas nas asas; Já alguns répteis como a tartaruga almiscareira ou a jiboia fazem isso através de áreas altamente vascularizadas entre as duras escamas ou placas dérmicas. No caso de serpentes marinhas, como a Pelamis platura, até 30% da troca de gases pode ser complementada pela respiração cutânea, principalmente quando submersas. Como regra geral, quanto maior a área superficial, maior a troca gasosa cutânea, mas muitos vertebrados apresentam especializações que aprimoram a eficiência da troca gasosa pela pele. Um detalhe que a imagem ao lado deixa bem claro é que a quantidade de oxigênio adquirido quase nunca é igual à de gás carbônico, esta, inclusive, sendo nula em diversos casos. Isso ocorre pois a respiração cutânea, em quase todos esses casos é uma forma secundária, auxiliando a respiração branquial ou pulmonar a dar vazão em alguns gases. Nos anfíbios, uma característica quase unânime é a pele glandular, sem escamas bem fina, úmida e muito vascularizada. Isso ocorre, via de regra, para facilitar a difusão de gases através dela. Na imagem logo abaixo podemos ver um esquema de como ocorre a difusão de gases pela pele dos anfíbios. No inverno, é comum a respiração cutânea superar o aporte de oxigênio gerado pelo pulmão, nos anfíbios. Você também pode ter ficado curioso com o fato dos humanos estarem nessa lista, mesmo com um índice baixíssimo. A respiração cutânea nos seres humanos se deve à uma troca minoritária através da própria mucosa interna do nariz e da boca, mas é quantitativamente irrelevante perto da respiração pulmonar. 

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Repare nas glândulas de veneno (poison gland), uma unanimidade nos anfíbios, além de glândulas de muco (mucous gland), necessárias para manter a pele sempre úmida. Essas glândulas excretam o que faz com que a pele dos anfíbios tenha o aspecto viscoso e escorregadio que vemos.  Repare como a rede de capilares é bem superficial, para captar o oxigênio com maior facilidade (lembra do que eu falei lá em cima sobre a taxa de difusão?)

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Você conhece a "rã peluda"?. Claro que não se tratam de pelos propriamente ditos (que só surgem nos mamíferos). Nos machos da espécie Trichobatracus robustus, muitas papilas surgem na época reprodutiva para formar um órgão respiratório complementar, pois essas projeções que lembram pelos aumentam a área de contato com o ar.

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E olha que curiosa essa espécie de anfíbio (Telmatobius culeus) cheia de "pelanca". Essa espécie ocorre no Lago Titikaka, na fronteira do Peru com a Bolívia. É o maior lago da América do Sul. Esse excesso de pele é, na verdade, uma estratégia para aumentar a área de superfície da pele com o meio, aumentando, consequentemente a área de contato para trocas gasosas por meio cutâneo.

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Uma última espécie que gostaria de mostrar, que depende de uma forma importânte da respiração cutânea é a Periophthalmus modestus, conhecido também como peixe-saltador-de-lama. Ele consegue ficar grandes períodos fora d'água graças às sua respiração através da pele e da mucosa orofaríngea. Quando estão fora da água, suas aberturas operculares são vedadas por uma válvula intermédia ventrolateral, impedindo que entrem em contato com o oxigênio, o que poderia colapsá-las. Esses peixes são famosos pelo seu curioso comportamento, que coloquei no vídeo ao lado.

Pulmão dos anfíbios: respirar, coaxar e inflar

Os anfíbios, como vocês sabem, possuem uma forma jovem chamada de girino. Durante essa fase, são essencialmente aquáticos, possuindo uma combinação de respiração branquial e cutânea. Os adultos que passam por metamorfose completa continuam utilizando a respiração cutânea, porém perdem as brânquias e desenvolvem pulmões que vão sendo progressivamente utilizados à medida que se desenvolvem. Quanto à morfologia, há variações de acordo com os diferentes grupos de anfíbios, indo desde um tipo simples em forma de saco e com paredes lisas (algumas salamandras) até pulmões subdivididos (anuros), como veremos abaixo. Os mais semelhantes ao do homem é o dos anuros, que são subdivididos apresentando um aspecto alveoladoAlgo muito importante sobre a respiração dos anfíbios é que ela ocorre por pressão positiva.

Olha bem para o vídeo ao lado antes de continuar lendo. Não tem nada demais. Se você já viu um sapo, já viu ele fazendo esse movimento com a boca. Pois nesse movimento ele está respirando. Pode parecer estranho que ele respire de boca fechada, mas é justamente assim que ele consegue fazer pressão positiva, usando a narina e o espaço interno da cavidade oral. "Durante o primeiro estágio de inspiração, os músculos da parte inferior da cavidade oral puxam o ar pelas narinas. A seguir, com as narinas e a boca fechadas, ele levanta a parte inferior da cavidade oral, forçando a passagem do ar pela traqueia. Durante a expiração, o ar é forçado para fora pelo recuo dos pulmões - que são bem elásticos- e pela compressão da parede corporal muscular". Ou seja, o ar entra quando é empurrado pela cavidade oral em direção ao pulmão. Por isso falamos que os sapos respiram por pressão positiva. Tem algo que empurra esse ar. Agora reveja o vídeo considerando esses fatos que você leu acima. Talvez facilite um pouco a compreensão se você vir o esquema logo ali embaixo! Os anfíbios ainda usam as trocas gasosas para vocalizar e para se inflar. Quando os machos de rãs ficam inflados em demonstração de agressividade ou de corte, eles interrompem o ciclo respiratório e retêm o ar várias vezes sem permitir qualquer liberação. é uma estratégia para parecerem maiores e intimidar possíveis predadores.

Outro evento relacionado à respiração, nos anuros, é o coaxar (vocalização). Praticamente todas as espécies de anuros têm algum tipo de vocalização, sendo os mais comuns cantos de anúncio, para atrair as fêmeas e mediar interações agressivas entre os machos. Anuros também podem vocalizar para defender territórios, ou ainda em ocasião de briga ou de estresse. Para coaxar, esses animais fazem um sistema diferente da a respiração acima descrita. Ocorre o seguinte:

(A) Com o pulmão já cheio de ar, o animal abre suas narinas para encher a cavidade bucal também com ar. (B) Depois, abre a glote e empurra o ar do pulmão para a cavidade bucal, que fica absurdamente cheia de ar, pois o ar que já estava nela, agora está somado do ar que estava no pulmão, ficando com um aspecto como na foto abaixo.

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Répteis e Mamíferos: evolução do pulmão alveolar

O pulmão tem um aspecto de "saco", em qualquer espécie. Ao lado, temos uma imagem com dois modelos de pulmões de anfíbios. O (A) ocorre em salamandras pulmonadas e o (B) em anuros (sapos, pererecas e rãs). A diferença é bem grande, não só no formato, mas no aspecto alveolar. Alvéolos são ramificações internas do pulmão que tem o efeito incrível de aumentar a área de contato do ar com superfícies de trocas gasosas. Olhe bem para o pulmão (B). de todo espaço interno do pulmão, somente nas paredes e no contorno dos ainda simples alvéolos ocorre troca gasosa. Todo gás que não está em contato com essas estruturas é inútil no sentido de troca gasosa. Não se difunde para o sangue. Para se ter uma noção, Os pulmões humanos contêm milhões de alvéolos, que juntos têm uma área de superfície de cerca de 100 metros quadrados. Você tem noção o que é 100 metros quadrados? Até chegar a esse grau de superfície de contato, os pulmões dos vertebrados foram se tornando cada vez mais alveolados, o que já é visível no pulmão dos anuros.

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O Pulmão III na imagem ao lado é um esquema geral de pulmão de réptil e o aspecto alveolado já é bem mais demarcado. Evolutivamente falando, o grupo dos répteis, derivados a partir dos anfíbios, demarcam uma conquista definitiva do meio terrestre, com diversas características que os tornam independentes da água para reprodução e desenvolvimento. Se você se lembrar bem, os anfíbios realizam fecundação na água, têm uma forma jovem que é aquática (girino), dependem de pele úmida para respirar e daí em diante. Então você não vai encontrar um anfíbio no meio do deserto do Saara. Já nos répteis, as escamas (nas serpentes), carapaças (nas tartarugas) ou placas córneas (nos crocodilos) tornam a pele impermeável, ou seja, diminui muito a perda d'água através da pele. Além disso, os 

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répteis também têm fecundação interna, gerando ovos que não ressecam diante de temperaturas maiores, pois estão protegidos por uma casca calcária. Além de todos esses fatores, os répteis apresentam uma forma muito mais eficiente de respirar ar, com pulmões muito mais alveolados. Por conta disso, dificilmente eles dependem de formas alternativas de respiração e podem viver mais afastados de fontes fixas de água.

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Os mamíferos se originaram a partir de um ancestral do grupo dos répteis, preservando o aspecto alveolar do pulmão, como já vinhamos falando. Se você olhar para a visão externa do nosso pulmão (à esquerda) e imaginá-lo como um saco vazio que somente faz trocas com o sangue através das suas paredes internas, você estará subjugando a capacidade de superfície que o seu pulmão tem. Como já dissemos lá em cima, um ser humano adulto possui uma área de superfície média de 100 metros quadrados graças às ramificações internas, chamadas de brônquios, que depois se ramificam em bronquíolos (à direita). No final de cada um dos bronquíolos, há um saco terminal chamado alvéolo pulmonar (abaixo). Depois falaremos mais um pouco sobre o processo de hematose, então voltaremos a falar mais sobre essas estruturas. 

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Esse esquema é muito interessante, pois vai mostrando como as vias aéreas vão se ramificando para tornar as superfícies de troca cada vez menores em tamanho, mas mais eficientes em área de contato com o ar. Repare na coluna "Quantos?" e na coluna "Diâmetro". Conforme vai se ramificando, o diâmetro vai diminuindo. Ao contrário do que possa parecer, isso aumenta a área de contato, visto que as trocas são feitas somente pelas paredes e o espaço interno é "morto" no sentido de trocas gasosas. Então, quanto menor o volume, maior a relação supefície/espaço interno.

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Mecânica Respiratória e Pressão Negativa

Os pulmões possuem um aspecto esponjoso e elástico. Ou seja, eles não são musculosos. Isso significa dizer que a sua expansão e retração não são coordenadas por uma musculatura própria, como no coração. Esse processo vai se dar pelo movimento de músculos da Mecânica Respiratória. Ela consiste no processo de contração e relaxamento de três grupos musculares: intercostais internos, intercostais externos e diafragma. Veja o vídeo ao lado para observar como eles se movimentam para gerar uma expansão e retração na caixa torácica. As musculaturas intercostais (interna e externa) trabalham ampliando e encolhendo as costelas. Inclusive, têm esse nome (intercostais) justamente por ficar entre os ossos da costela. O diafragma é uma musculatura que fica abaixo do pulmão. Você já sentiu esse músculo mesmo se não tiver conhecido antes: já sentiu uma dorzinha na lateral da barriga quando você corre muito? É uma cãimbra no diafragma. Tanto que se você respirar muito forte com essa dorzinha, ela se intensifica.

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Lembra que, nos anfíbios falei que eles respiram por pressão positiva? Pois captam o ar com a narinas e depois empurram ativamente esse ar para o pulmão? No nosso caso, respiramos por pressão negativa (que é o equivalente à uma pressão de "sugar" algo, como um aspirador de pó). Bom, tudo bem, mas onde essa pressão negativa se forma e como ela é importante na nossa mecânica respiratória? Os nossos órgãos torácicos são envolvidos pelo peritônio, que é uma membrana serosa que diminui o atrito dos órgãos com a caixa torácica e também entre órgãos diferentes. Só que essa membrana não chega a encostar no pulmão, pois existe uma cavidade que as separa. Essa cavidade é chamada de cavidade pleural. Acompanhe a explicação com as imagens ao lado para não se perder. Essa cavidade é preenchida parcialmente por um liquido chamado de líquido interpleural, que possui a função de reduzir o atrito entre pulmão e víscera, que ocorre durante o processo respiratório. Para você entender direitinho, é como se fosse um balão de ar (pulmão) circundado por um balão de água (saco pleural). O líquido interpleural é oriundo do sistema linfático, para onde é constantemente reabsorvido. Seu volume é aproximadamente 25 a 30 mL em um homem adulto de 70kg. É nessa reabsorção que surge a pressão negativa. Ou seja, essa cavidade só possui um único contato com o meio externo, através de vaso linfático. Tirando isso, essa cavidade é vedada. E esse vaso linfático retira constantemente líquido interpleural da cavidade, aspirando-o para o sistema linfático. Essa retirada constante, faz com que a cavidade pleural possua uma pressão negativa. 

Essa pressão negativa é importante pois, na medida que a pessoa inspira, expandindo a caixa torácica, o pulmão tende a acompanhar essa expansão (na mesma lógica de conseguir manter uma folha de papel aberta aderida a um aspirador de pó). Em outras palavras, como existe uma pressão de "sugar" na cavidade que separa o pulmão da caixa torácica, na medida que a caixa torácica se expande, o pulmão inevitavelmente se expande junto, respeitando as leis da física. Os verdadeiros responsáveis pela entrada e saída de ar nos pulmões são, portanto, os músculos da mecânica respiratória (intercostais e diafragma) e não o pulmão propriamente dito.

Por que o ar entra ou sai do pulmão?

Com toda a explicação que fiz no início do conteúdo de Respiração, sobre as pressões dos gases, mais a explicação sobre a mecânica respiratória, fica mais fácil de entender que o ar entra ou sai dos pulmões como uma consequência natural da sua expansão ou retração. Funciona mais o menos assim: quando a caixa torácica se expande, o pulmão e alvéolos se expandem junto, aumentando o seu espaço interno. Quando aumentamos o espaço interno, a pressão nos gases dentro do pulmão fica menor do que a pressão dos gases fora do pulmão. Como os gases tendem a passar do ambiente com maior pressão para o de menor pressão, o ar entra. Simples assim. O contrário também é verdadeiro, no processo de expiração. Se você não tiver associando o que tem a ver aumentar o espaço interno do pulmão com diminuir a pressão dentro dele, só lembrar da fórmula de pressão dos gases: P.V = n.R.T. Então, se não se altera o número de mols (n) nem a temperatura (T), mas aumenta o volume (V), a pressão diminui dentro do pulmão. Aí o ar entra.

Aí, temos que fazer uma ressalva: nós inspiramos e expiramos ar atmosférico. É conceitualmente equivocado dizer que inspiramos oxigênio e expiramos gás carbônico, visto que não há nenhuma seleção de quais moléculas do ar atmosférico vão entrar nos pulmões na inspiração. Essa seleção é feita somente no processo de hematose pulmonar, que vamos discutir a seguir.

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Hematose pulmonar e as hemácias

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Os alvéolos, como vimos até agora, são estruturas saculiformes (com forma de saco) que existem na terminação de todos os bronquíolos dos pulmões. Se você navegar no modelo 3D de alvéolo que eu dispus aqui ao lado, verá que cada um dos nossos milhões de alvéolos está recoberto por uma rede de capilares sanguíneos, tão finos, mas tão finos, que possuem apenas uma camada de células formando a parede do vaso. O mesmo ocorre para os alvéolos, que têm paredes tão finas quanto uma única camada de células. Essa "finura" toda tem razão: quanto menos células o gás tiver que atravessar para passar dos alvéolos para o sangue e vice-versa, mais fácil e com mais eficiência esse processo ocorrerá. A passagem do ar atmosférico de dentro dos alvéolos para a corrente sanguínea é chamado de hematose pulmonar, ou só hematose (pros íntimos).

O sangue desoxigenado chega no pulmão através das artérias pulmonares. Observe, na imagem ao lado, o sangue que está indo ao encontro do alvéolo. Nele, a pressão parcial de oxigênio é 40 mmHg (se lê milímetros de mercúrio); a de gás carbônico é 45 mmHg. Quando o alvéolo se enche de ar atmosférico, na inspiração, a pressão parcial dos gases dentro dele é mais ou menos a mesma da atmosfera (onde a concentração de oxigênio é muito superior à de gás carbônico). Então temos, dentro dos alvéolos, uma pressão parcial de oxigênio igual a 104 mmHg e de gás carbônico 40 mmHg.

Logo, nada de novo em relação à lógica de movimento dos gases que estamos estudando até então: a pressão parcial de Oxigênio (pO2) é maior nos alvéolos (104 mmHg) do que nos capilares sanguíneos (40 mmHg) que chegam até ele, então o oxigênio passa para os capilares. A pressão parcial de gás carbônico (pCO2) é menor nos alvéolos (40 mmHg) do que nos capilares sanguíneos (45 mmHg) que chegam até ele, então o gás carbônico passa para os alvéolos pulmonares. É isso que determina a saída líquida de gás carbônico e entrada líquida de oxigênio na hematose: diferença de pressão parcial desses gases entre os ambientes intralveolar e sanguíneo.

Uma vez no sangue, o Oxigênio vai ser levado aos tecidos pelas hemácias. Elas têm outros nomes como Eritócito, Células Vermelhas, Glóbulos Vermelhos, etc. Todos esses nomes se referem à mesma coisa, tá? As hemácias (como eu prefiro chamar) possuem formato discoide e achatado. Elas não possuem núcleo, DNA, nem praticamente nenhuma organela membranosa justamente para serem leves e concentrar energia e espaço para sua função: carrear oxigênio pela corrente sanguínea até todos os tecidos corporais. Cada milímetro cúbico de sangue humano tem cerca de 5 milhões de hemácias. Essa capacidade da hemácia de "carrear" oxigênio existe graças à uma proteína que fica na sua membrana, chamada hemoglobina. Cada hemácia têm cerca de 250 milhões de moléculas de hemoglobina na sua membrana. Tá fazendo as contas aí? Cada hemoglobina têm a capacidade de se ligar à quatro moléculas de oxigênio (já vamos ver porquê). Então, cada milímetro cúbico de sangue tem a capacidade de carregar até 5 quatrilhões (5x10^15) de moléculas de oxigênio. Isso, claro, estamos falando de indivíduos adultos, saudáveis, ao nível do mar.

 

 

Pois bem, vamos falar um pouco mais sobre essa proteína chamada hemoglobina. Ela é, na verdade, uma hemeproteína, o que significa que ela tem as sequências de aminoácidos, mas também tem um grupo heme. Esse grupo dá a cor vermelha à proteína. É daí que vem o fato de tudo que tem a ver com sangue ter o prefixo Heme. Hemorio, hemofilia, hemoglobina, hemácia, hemodiálise, etc.  Ou seja, tudo que envolve sangue tem o prefixo heme, já que o sangue é vermelho graças ao grupo heme das hemoglobinas. Então, deve ter algo de importante nesse grupo heme. Vamos descobrir do que se trata.

Essa é a hemoglobina. É uma hemeproteína globular que possui quatro subunidades. Como uma casa com quatro cômodos. Cada subunidade possui um grupo heme, representado na imagem ao lado como a parte mais escurecida da molécula. Olhando pra estrutura química do grupo heme, abaixo, é possível ver que possui quatro nitrogênios ligados à uma molécula de Ferro II. O Ferro no estado ferroso (II) têm a capacidade de fazer seis ligações para completar o octeto. Assim, fazendo quatro ligações com os nitrogênios que estão ao seu redor e uma ligação com a estrutura proteica que está abaixo do grupo heme, sobra uma ligação, que é exatamente onde o oxigênio entra. Então, resumindo em uma frase: cada oxigênio se liga à hemoglobina através da molécula de Ferro (II) do seu grupo heme.

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Quando o Ferro se liga ao Oxigênio, sempre de forma reversível, ele provoca mudanças na estrutura da proteína, fazendo com que os outros três grupamentos heme, das outras subunidades, tenham mais afinidade pelo oxigênio. Em outras palavras, toda vez que uma molécula de oxigênio se liga ao grupamento Heme em uma das subunidades, a conformação da hemoglobina é alterada e isso faz com que as outras três subunidades tenham uma maior afinidade cada vez maior pelo oxigênio. Para quantificar um pouco, estima-se que a última subunidade a se ligar ao O2 tenha uma afinidade 300 vezes maior do que a primeira. Este é um fenômeno químico chamado de cooperatividade. Por conta desse comportamento, o gráfico de oxigenação da hemoglobina (Hb) tem um crescimento exponencial, como podem ver ao lado.

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Fatores que interferem na ligação Hb-O2

Qualquer fator que mude a conformação da proteína hemoglobina pode afetar a sua capacidade de ligação ao oxigênio. Muitas coisas afetam a conformação das proteínas, sendo as principais, temperatura e pH. O fator temperatura talvez seja o mais fácil de compreender, já que quanto maior for a temperatura, mais agitação as moléculas possuem; logo, mais difícil se torna de sustentar as ligações intramoleculares, fazendo com quem muitas delas se rompam. Agora, quando estamos falando de pH, estamos falando de concentração de íons H+ no meio. É um número que vai de 0 a 14, sendo o 7, um pH neutro. Quanto maior a concentração de íons H+, maior a acidez, logo, menor o pH (exemplo: um pH = 2,0 é bem ácido; um pH = 11,5, bem básico). Agora, por que há uma diminuição de afinidade? O aumento da quantidade de íons H+ no meio, faz com que eles disputem o sítio de ligação do Ferro com o Oxigênio. Assim, quanto maior a concentração de H+ no meio, maior essa disputa, então menor a afinidade da Hb pelo O2. A principal fonte de aumento da concentração de íons H+ no sangue é o aumento da concentração de gás carbônico (CO2), pois a forma como ele é transportado pelo sangue envolve a sua reação com água (H2O) formando ácido carbônico (H2CO3), e sua subsequente dissociação em bicarbonato (HCO3) e H+. Assim:

CO2 + H2O <> H2CO3 <> HCO3 + H+

As alterações na afinidade de ligação são refletidas pelas mudanças na forma da curva de saturação HbO2, como podemos ver gráfico ao lado. A diminuição do pH (acidificação), diminuem a afinidade da hemoglobina pelo oxigênio e deslocam a curva de saturação da oxi-hemoglobina para a direita. Para te ajudar a ler esse gráfico e a variação de afinidade faça o seguinte: encontre o valor de pressão (PO2) de 30mmHg (você vai encontrá-lo no eixo x do gráfico). Agora veja à qual percentual de saturação da hemoglobina (eixo y) ele corresponde em determinado pH. Então façamos a seguinte leitura:
Quando, em um meio, a pressão parcial de oxigênio está 30mmHg, caso o pH esteja 7,6, a saturação das hemoglobinas estará próximo a 70%. Caso o pH esteja 7,4, a saturação das hemoglobinas estará próximo a 44%; Caso o pH esteja a 7,2, a saturação das hemoglobinas estará próximo de 36%. Ou seja, para uma mesma pressão parcial de oxigênio, quanto mais ácido o meio, mais a saturação das hemoglobinas diminui.

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Transporte propriamente dito: o oxigênio através do sangue

O oxigênio inalado na respiração entra nos capilares, dissolvendo-se no sangue. Então, logo apos essa difusão, a maioria do oxigênio se liga com as hemoglobinas das hemácias (formando o complexo HbO2) e uma parte minoritária do gás é transportado livremente, dissolvido pelo plasma sanguíneo mesmo. Como falamos lá no início da parte da respiração, a solubilidade do oxigênio em água não é lá essas coisas; e se você juntar lé com cré vai perceber que o plasma sanguíneo é constituído basicamente por água. Então, cerca de 98% do oxigênio vai ser carregado por associação com as hemoglobinas e 2% apenas será carregado na forma dissolvida no plasma sanguíneo. Então, aqui surge um fato interessante e aparentemente contraditório: justamente pela baixíssima solubilidade do oxigênio no plasma sanguíneo, a pressão do oxigênio dissolvido que vai "empurrar" o oxigênio para ser carregado pelas hemácias, ligando-se às hemoglobinas. É um controle bem fino, mas muito importante. Afinal, o transporte de oxigênio para os tecidos não-musculares vai depender dessa pressão do oxigênio dissolvido. Quando ela cai, o oxigênio ligado às hemoglobinas se desliga para se dissolver no plasma. É a Lei de Ação das Massas pura e simples.

Existem outras reações muito interessantes envolvendo as hemácias e os gases oxigênio e gás carbônico, mas vou deixar para explicar melhor em uma postagem do Blog, em breve.

"A reação de ligação da hemoglobina obedece à Lei de Ação das Massas. Lembra disso, da química? À medida que a concentração de O2 dissolvido aumenta, mais oxigênio liga-se à hemoglobina, e, assim, a equação desloca-se para a direita, produzindo mais oxihemoglobina (HbO2). Se a concentração de O2 diminui, a equação desloca-se para a esquerda. A hemoglobina libera o oxigênio, e a quantidade
de oxi-hemoglobina diminui"
(Silverthorn, 7ª ed).

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Das hemoglobinas para os tecidos

Bom, até o momento já entendemos de forma mais detalhada os motivos biofísicos para o ar entrar nos pulmões; também já vimos as razões para o ar passar do interior dos pulmões para a corrente sanguínea (hematose pulmonar) e agora vamos compreender o porquê, uma vez ligados à hemoglobinas, sendo carregados pela corrente sanguínea, o oxigênio passa para os tecidos. Depois, para fechar, vamos buscar compreender como um bebê respira dentro do corpo da mãe.

Aqui, vai entrar um personagem importante na nossa narrativa: a mioglobina. Ela é uma hemeproteína existente no tecido muscular (por isso o prefixo mio-, que vem de músculo). Tem uma estrutura parecida com a da hemoglobina, entretanto, não possui quatro subunidades: possui apenas uma, sendo considerada a hemeproteína mais simples (estruturalmente) do processo de transporte de oxigênio. Por esse motivo, todo evento químico de cooperatividade, que descrevemos acima, não ocorre na Mioglobina.

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Um resumo da dinâmica respiratória humana, cuja troca de gases sistêmica oferece oxigênio para o processo de produção de energia nas células (respiração ceular)

A hemoglobina, diferente da mioglobina funciona de acordo com a pressão de O2. Repare no gráfico ao lado. Onde há uma alta pressão parcial de oxigênio (como lá no 80 torr), ambas estão saturadas e onde há uma baixa pressão (como no 5 torr), só a mioglobina está associada ao O2. Isso indica que a mioglobina têm uma afinidade pelo oxigênio mais alta se comparada à hemoglobina. Ou seja, a mioglobina se satura de oxigênio em concentrações que a hemoglobina nem sonha em se ligar ao primeiro dos quatro oxigênios que ela têm capacidade. Isso tem uma relevância tremenda pois o grau de afinidade da hemoglobina e da mioglobina pelo oxigênio falam tudo sobre sua participação no processo. Por ser uma proteína de transporte de oxigênio, a hemoglobina têm de ter uma afinidade

não tão alta pelo oxigênio, já que ela se satura no pulmão e tem que "soltá-lo" nos tecidos. Se ela tiver uma super afinidade pelo oxigênio, ela vai se saturar no pulmão e não vai soltá-lo nunca. Aí que entra o fato da mioglobina ter uma afinidade maior pelo oxigênio que a hemoglobina. Estando fixa nos tecidos musculares, a mioglobina dá a cor vermelha aos nossos músculos e é a responsável por captar o oxigênio da circulação sanguínea para o tecido muscular. Logo, a mioglobina funciona bem como uma reserva de oxigênio nos músculos, enquanto a hemoglobina é mais sensível a variações, justamente por ter uma função carreadora.

Então, vale aqui a informação adicional: consideramos "carnes vermelhas" as carnes de mamíferos, justamente pela presença dessa hemeproteína nos músculos. Aqueles que possuem "carne branca", não a possuem. Por isso carne de boi e porco são consideradas "carnes vermelhas".

Em relação aos tecidos que não necessariamente sejam musculares, temos um transporte de Oxigênio baseado em diferença de pressão de Oxigênio, como já vinhamos mostrando desde o início. Neles, o oxigênio dissolvido difunde-se dos capilares para as células, que têm uma menor pressão parcial do gás, por tê-lo consumido em processos metabólicos de produção de energia, como a respiração celular. Nos músculos, uma reserva de oxigênio governada pelas mioglobinas foi evolutivamente selecionada pelo fato da musculatura ser uma das maiores consumidoras de energia do corpo. Ela costumeiramente é acionada sem nenhum aviso prévio, como para fugir ou enfrentar um predador ou situação adversa. A ausência de um aporte grande de oxigênio no tecido muscular pode fazer com que ele não consiga produzir energia suficiente para sustentar uma fuga, etc, diminuindo as chances de sobrevivência, logo, da transmissão dessas características menos vantajosas para a prole. Nossa, que volta ao mundo, né.. Mas eu gosto de fazer esse link com evolução para que vocês percebam que todas as características fisiológicas e anatômicas dos seres vivos possuem razões evolutivas para existir. A nossa musculatura, por exemplo, possui a capacidade de produzir energia mesmo na ausência de oxigênio, por meio da fermentação. O único problema é que, em altas taxas fermentativas, se acumula o principal produto dessa fermentação, que é o ácido lático, causando contraturas musculares involuntárias que conhecemos como cãimbras. Isso tá explicado em outra sessão.

Mioglobina

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Como os fetos respiram?

Como vocês sabem, os fetos ficam imersos no líquido placentário até o momento que a "bolsa estoura" e você tem que sair correndo desesperada pro hospital. Então, os fetos humanos passam cerca de nove meses (ou 40 semanas, como as grávidas gostam de falar), imersos em um líquido, respirando mesmo sem ter brânquias. Bem, eles não respiram com os seus pulmões, isso é um fato, já que esses órgãos só estão bem formados a partir da 34ª semana. Eles respiram pelo cordão umbilical, seu ponto de troca de nutrientes, anticorpos e gases com a mãe. Então, veja só: além de comer por dois, a mãe também respira por dois. (toda honra e glória às mães). O que vai ocorrer é que aquele oxigênio captado pela troca de gases no pulmão da mãe, vai circular todo o seu próprio organismo, mas também vai ser transportado para o feto a partir dos vasos sanguíneos que irrigam o cordão umbilical. O cordão se forma junto com a placenta, nos estágios iniciais de implantação do embrião (nidação). Até lá, a nutrição do embrião é fornecida pelo corpo lúteo, um resíduo lá do folículo ovariano que ficou abandonado quando a mulher ovulou. Depois, a nutrição passa a ser placentária, através do cordão umbilical, uma exclusividade dos mamíferos. Ou seja, todos os mamíferos placentários (o que exclui cangurus e ornitorrincos) têm umbigo; mas, na maioria deles, o a cicatriz do umbigo se torna invisível ou muito discreta com o crescimento do animal. Quando ainda bem filhotes, as vezes, é possível ver.

Aqui, vai entrar um último personagem importante na nossa história: a hemoglobina fetal. Em relação à adulta, há algumas diferenças na sua estrutura. Enquanto a hemoglobina adulta consiste em 4 subunidades (2α e 2β), a fetal consiste em 4 subunidades: 2α, 1β e 1γ. Para entender a relevância dessa diferença, vamos ter que falar sobre o Efeito BPG. O 2,3-bifosfoglicerato (BPG) é uma substância encontrada no interior das hemácias, responsável por reduzir a afinidade da hemoglobina (Hb) pelo oxigênio (O2) através da sua ligação à hemoglobina. Nossa, mas qual o interesse nosso organismo teria em reduzir a afinidade da Hb com O2 propositalmente? Simples: o BPG têm uma importante função em momentos de baixa concentração de oxigênio atmosférico, como por exemplo, em altitudes elevadas. Se a pressão de oxigênio em altitudes elevadas é menor, menos oxigênio se difunde para o sangue na hematose pulmonar. Logo, se a diferença entre a pressão de oxigênio sanguíneo e os tecidos não for suficiente, não vai existir passagem de oxigênio do sangue para os tecidos. Aí tu morre. Então, quando se diminui a afinidade da hemoglobina pelo oxigênio, aumenta a quantidade de gás que vai circular na forma dissolvida no plasma, aumentando assim as chances que ela doe esta molécula aos tecidos extrapulmonares, entendeu?

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Voltando para a hemoglobina fetal, aquela pequena diferença em uma das subunidades é que a subunidade gama substitui um aminoácido positivo por um sem carga, e por esta razão a interação com a BPG (que é uma molécula negativa, como você pode ver ao lado) é menor.  

A interação entre uma molécula positiva e outra negativa é muito maior do que entre uma negativa e uma neutra. Então, por possuírem menos afinidade pelo BPG que a hemácia adulta, a hemácia fetal acaba possuindo uma maior afinidade pelo oxigênio. Este é um fator fisiologicamente importante para o feto, pois a partir do momento que a suas hemácias possuem uma maior afinidade com o O2 do que as de sua mãe, é mais provável que o O2 seja transferido do sangue materno ao sangue fetal, garantindo que o aporte de oxigênio para o feto seja constante e mais independente das condições ambientais extra-corpo da mãe. Gente, isso é um absurdo de maneiro.

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Como os ovos respiram?

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É muito legal, muito bonito de entender como os filhotes de mamíferos se desenvolvem e respiram, mas é muito mais fácil de imaginar, já que a mãe troca fluidos, nutrientes e gases com os filhos pelo cordão umbilical. Mas nem todos os animais se desenvolvem dentro do corpo da mãe (vivíparos). Há animais ovíparos, que se desenvolvem dentro de ovos; ainda, há os ovovivíparos, onde a mãe permanece com os ovos dentro do corpo durante todo o seu desenvolvimento, fazendo sua postura somente instantes antes do choco. Tanto no caso dos ovíparos quanto dos ovovivíparos, não há cordão umbilical. Então, como esses fetos obtém gases? 

Não sei se você sabe, mas os ovos são ou bem maleáveis ou microporosos. Nem todo ovo têm uma casca super dura. Alguns são bem molenguinhas, permitindo trocas de água e gases com o meio. Além disso, nos ovos mais rijos, há uma forma de reserva de gases tóxicos (CO2), formando uma bolsa de gás entre a da membrana da casca e a casca propriamente dita. Você já viu uma situação parecida com a da casca na foto ao lado? Pois então.

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