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Algumas pessoas pegam Corona Vírus de novo. Por quê?

Atualizado: 25 de mai. de 2020

Veio da China a notícia de que pacientes já curados de Corona Vírus deram entrada novamente em hospitais com os sintomas e seus exames de sangue eram enfáticos: estavam infectados novamente pelo vírus [1]. Primeiramente, foi aventado que poderia ter havido não uma cura completa, mas um abrandamento dos sintomas. Assim, teria ficado a impressão de cura e a posterior alta do hospital e logo depois os sintomas voltariam a aparecer. Mas os pacientes tinham feito exame de sangue que mostrava ausência do vírus na circulação. Então, pensou-se que o vírus havia sido combatido, estando ausentes nos exames pós-cura, mas que poderia ter sido reativado posteriormente. Os mecanismos para embasar essa hipótese não eram claros [2]. As alternativas perderam força através das descobertas de um estudo preliminar que vou explicar pra vocês nesse post.


Primeiro, acho que cabe explicar o motivo do espanto. Normalmente, nosso sistema imunológico, ao lidar com uma infecção bacteriana ou viral, produz anticorpos altamente específicos para identificar esse patógeno e destruí-lo. Isso demora cerca de três dias, mas depende de pessoa pra pessoa. Depois que você vence a infecção, alguns anticorpos de memória imunológica são produzidos. Assim, caso você volte a ter contato com este exato mesmo patógeno, o seu corpo já produzirá uma resposta tão mais rápida em relação à ultima vez, que o agente infeccioso não consegue nem se instalar e reproduzir no seu organismo. Aí você pode me perguntar. Por que então pegamos a mesma gripe toda hora? Porque não é a mesma. Você pega mutações do vírus influenza, que é aquele responsável pela gripe. Por que você pegou dengue mais de uma vez? Porque não pegou o mesmo vírus. A dengue possui 4 subtipos. Isso significa que você pode pegar até quatro vezes a dengue. Em relação ao Corona Vírus, o virologista espanhol Luis Enjuanes, afirma haver "uma porcentagem de pacientes, de pelo menos 14%, que, depois de terem testado negativo, retornaram ao positivo". Teria o Corona Vírus, então, mutado?


O novo Corona Vírus (CoViD-19) já é resultado de uma mutação. Não sei se você sabe, mas Coronavirus é um gênero de vírus e, junto com o gênero Torovirus, formam a família Coronaviridae. Enquanto o coronavirus está relacionado com doenças respiratórias, como o MERS, o SARS e mais recentemente aquela causada pelo CoViD-19, os Torovirus estão relacionados com doenças intestinais em animais como cavalos, porcos e gatos. Todos os vírus da família coronaviridae têm uma coisa em comum: projeções numerosas no envoltório protéico que o deixam com aspecto de coroa solar, o que justifica seu nome (foto abaixo). Então, o novo corona vírus (CoViD-19) não só é resultado de uma mutação de algum vírus anterior da família coronaviridae, como ele próprio já possui mais de 3 variações confirmadas [3], embora não seja característico da família uma alta taxa de mutação. Essas mutações fizeram com que a doença que se manifesta em determinados países tenha discretas mudanças em relação a outros países.

Mas se acalme. O fato de ter mutações não significa que ele se torna mais agressivo, somente diferente. Um aumento na agressividade dele é uma mudança que pode ocorrer ao acaso, mas não é determinado por uma mudança por si só. Essa taxa constante de mutação é comum a vírus e bactérias, o que com certeza é uma pedra no sapato de indústrias de vacinas. Afinal, o processo de produção de vacinas é demorado e rigoroso e pode ser que, ao concluir uma vacina, nem seja mais aquela variedade a predominante em circulação. E o nosso sistema imunológico é tão específico que sim, isso inutilizaria a tentativa de controlar a pandemia através dessa vacina. Além do fator mutação, temos que a memória imunológica que citei anteriormente varia de duração. Pro sarampo, você toma uma vacina quando criança e está imune por toda a vida. Pro tétano e febre amarela, no entanto, tem que dar reforço. Não sabemos ainda qual o comportamento da memória imunológica no caso do CoViD-19.


Agora vamos voltar a pergunta do post! Como os países fecharam fronteiras até cedo, digamos, não podemos considerar o fato da mesma pessoa ter sido infectada por duas variedades de CoViD-19. Ainda mais tão cedo na linha do tempo da doença. Ainda mais tão rápido para uma mesma pessoa: um idoso japonês de 70 anos reapresentou febre alguns dias depois da alta do hospital. Ele havia retornado a vida normal, pegando transporte público e tudo acreditando estar imunizado. Depois de muitas especulações, um grupo de cientistas chineses divulgaram um estudo preliminar onde explicam que a presença de Anticorpos Neutralizantes (NAbs) no sangue de pacientes recuperados é a principal evidência da impossibilidade de adquirir novamente a doença. Inclusive, quando se trata da doação de plasma sanguíneo de pacientes curados para pacientes em estado mais grave, a eficácia da terapia passiva com anticorpos é associada à concentração de em plasma ou anticorpos desses doadores. O estudo analisou um total de 175 pacientes com COVID-19 que se recuperaram e receberam alta do Centro Clínico de Saúde Pública de Xangai em 26 de fevereiro de 2020. Seus sintomas eram comuns ou leves, e nenhum deles foi internado na UTI. A idade média dos pacientes foi de 50 anos (variando de 16 a 85 anos). O tempo médio de permanência hospitalar foi de 16 dias (variando de 7 a 30 dias) e a duração mediana da doença foi de 21 dias (9 a 34 dias). Analisaram cinco amostras de cada paciente, colocando-as para reagir com o novo corona vírus. A pesquisa identificou que cerca de 8% das pessoas avaliadas não criaram as defesas contra um novo contágio. Aproximadamente, seria o mesmo que dizer que uma a cada dez pessoas não desenvolveram anticorpos para a doença.


E o que pode parecer um contra censo, é que “a maioria das pessoas que não desenvolveram anticorpos detectáveis contra a covid-19 não eram idosos. Nove a cada dez pacientes que não tinha as defesas do organismo contra a doença após uma primeira infecção tinham 40 anos de idade ou menos. Foram avaliados indivíduos com idades entre 16 e 68 anos, agrupados, por faixa etária, em três grupos distintos.” Na maioria das pessoas avaliadas, os anticorpos surgiram de dez a 15 dias depois do início da doença. Outra descoberta desse estudo preliminar foi que os idosos recuperados apresentaram um maior número de anticorpos com potencial de neutralização do vírus do que os jovens. Vale lembrar que o estudo é preliminar e tem várias limitações, como os autores mesmo ressaltam [4].

Primeiro, o RNA viral não era detectável no sangue dos pacientes. Devido à falta de amostras respiratórias, não havia informações disponíveis sobre a cinética das cargas virais. Segundo, os pacientes em estado grave e crítico foram excluídos do estudo porque receberam tratamento passivo com anticorpos antes da coleta das amostras. Portanto, não fomos capazes de avaliar diretamente o efeito dos NAbs na eliminação de vírus ou na progressão da doença em pacientes com COVID-19 neste estudo. Um estudo mais abrangente deve ser feito para abordar a questão.

Apesar dessas ressalvas, esse se mostra um importante caminho nessa longa trajetória para entender mais sobre aspectos virulentos e sobre o comportamento imunológico nos seres humanos.

REFERÊNCIAS

[1] Revista Exame | Coronavírus reaparece em pacientes que receberam alta - exame.abril.com.br/mundo/coronavirus-reaparece-em-pacientes-que-receberam-alta/

[2] BBC | Coronavírus pode infectar a mesma pessoa duas vezes? A pergunta que intriga cientistas - bbc.com/portuguese/geral-51954966

[3] BBC | Estudo aponta 3 tipos do novo coronavírus - bbc.com/portuguese/internacional-52247892

[4] Neutralizing antibody responses to SARS-CoV-2 in a COVID-19 recovered 2 patient cohort and their implications. Fan Wu, Aojie Wang, Mei Liu, Qimin Wang, Jun Chen, Shuai Xia, Yun Ling, Yuling 5 Zhang, Jingna Xun, Lu Lu, Shibo Jiang, Hongzhou Lu, Yumei Wen, Jinghe Huang. doi: 10.1101/2020.03.30.20047365. Disponível em: www.medrxiv.org/content/10.1101/2020.03.30.20047365v2.full.pdf

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