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SISTEMA NERVOSO E ESTÍMULOS AMBIENTAIS

Por que dividir em funções vitais?

Todos os seres vivos necessitam realizar suas funções vitais de alguma forma. Até mesmo uma bactéria, unicelular aeróbica, respira, digere e excreta nutrientes, etc. Com tamanhos, complexidades e ambientes tão diferentes, é de se esperar que existam distintas estratégias, adaptadas ao ambiente que vivem. Aqui, vamos conhecer algumas, para que nos lembremos sempre que diversos mecanismos evolutivos estão por trás dessas estruturas e processos metabólicos tão incríveis. 

Sist. Nervoso

Sistemas Nervosos: perceber e responder estímulos

Para trazer uma visão comparada do sistema nervoso temos que remontar à muito tempo, até quando ele não existia de fato. Pense aí rapidinho quais são as funções de um sistema nervoso. Basicamente processar estímulos do mundo externo e do mundo interno. Ele traduz experiências em sensações que você conhece bem, como a dor, medo ou conforto. Entretanto, a capacidade de perceber e sentir o ambiente tem sua origem à bilhões de anos, algo que remete à vida procariota. Sim, as interações entre bactérias são complexas e elas tem uma capacidade de perceber o ambiente que é muito subestimada. Coitadas. Perceber o ambiente é muito necessário visto que ele muda muito, a todo momento. Veja: a concentração de substâncias, pH, incidência de luz, para ficar em poucos exemplos, se modificam diariamente nos ecossistemas terrestres e marinhos. Os sistemas nervosos, dos mais simples aos mais complexos, oferecem, na verdade, uma interpretação para esses estímulos, uma concentração do processamento de informações em certos níveis (o que chamamos de cefalização) e uma maior rapidez na percepção e resposta à esses estímulos. Como consequência de interações cerebrais cada vez mais complexas, temos o raciocínio lógico, abstrato, imaginação e sentimentos. A partir dos sentimentos, que são guiados por uma força homeostática, criam-se culturas e invenções intelectuais como moralidade, justiça, religião, arte, filosofia e ciência. Para isso acontecer, muitos caminhos evolutivos se abriram e alguns foram, de fato, percorridos. Vamos investigar a evolução dos sistemas nervosos, a partir quando eles eram inexistentes.

Uma colônia da bactéria Pseudomonas aeruginosa

Só um detalhe: no reino animal temos alguns filos de invertebrados (esponjas, moluscos, artrópodes, etc) e apenas um filo de vertebrados (cordados). Os animais vertebrados são evolutivamente bem mais recentes e também são minoria. 97% das espécies animais é de invertebrados. então, dada a importância desse grupo, vamos passar por alguns deles para escrever essa história! 

Scott Chimileski_PA-L.jpg

A homeostase é o princípio que guia a vida

Tem um livro que gosto muito, chamado “A Estranha Ordem das Coisas”, de António Damásio. Para continuar entendendo bem as referências que faço, sugiro que você leia o post sobre Homeostase, lá no blog. Segundo o livro, as bactérias apresentam uma dinâmica social curiosa, onde são capares de cooperar com os seus pares, expulsar membros não-colaborativos e serem territorialistas também. Elas conseguem identificar, por sinalizações químicas da parede celular, quem são aqueles organismos “aparentados” ou aqueles que são estranhos. Quando um grupo de bactérias deseja se defender de alguma ameaça ou condição adversa (sim, elas podem atuar conjuntamente, de forma cooperativa), caso percebam que alguns indivíduos desertaram do esforço de defesa, elas o rejeitam, impedindo que o organismo acesse recursos alimentares. Claro que o autor não estabelece uma relação de causa-efeito entre a dinâmica social bacteriana e humana, mas ele esclarece algo importante: os comportamentos que elas desenvolveram agem obedecendo os mesmos imperativos homeostáticos que nós obedecemos. Ou seja, a verdadeira “linha invisível” que conecta todas as formas de vida é a homeostase. O que quero dizer é que elas sobrevivem há mais de 3 bilhões de anos num esquema “automático”, isto é, sem inteligência guiada por um cérebro, mas que funciona sob os mesmos princípios que o próprio cérebro, bem mais sofisticado e especializado. Então, podemos dizer sem constrangimentos, que a nossa mente e suas criações fizeram muitos empréstimos do passado remoto da Terra.

Os primeiros animais

Pense num animal. Agora em outro. Outro. Outro. Mesmo se eu repetir esse pedido cem vezes você não vai pensar numa esponja. Entretanto, as esponjas fazem parte do mesmo reino que você: Reino Metazoa, também conhecido como Reino Animalia. São 8 mil espécies diferentes de esponjas, sendo 98% marinhas e os outros 2% de água doce. Elas são conhecidas por não terem tecidos especializados, isso faz com que não tenham quaisquer órgãos ou sistemas, incluindo muscular, sensoriais e nervosos. Entretanto, isso não anula que elas possam ter células especializadas (a diferença é que essas células não se organizam na forma de um tecido especializado). Elas têm a capacidade, por exemplo, de distinguir quais células são do seu organismo e quais são de outros organismos (o que chamamos de histocompatibilidade). Há um tempo atrás acreditava-se que os animais invertebrados não possuíam capacidade de distinguir entre si (self) e o outro (nonself), mas isso foi observado, nos anos 80, em ouriços, estrelas do mar, insetos, crustáceos, anelídeos, moluscos, cnidários e até em esponjas. Hildemann e Johnson, em 1979, fizeram testes com a esponja Callyspongia difusa e perceberam que têm um mecanismo de “reconhecimento imune” altamente sensível, capaz de distinguir quais células são de outras espécies e desenvolver reações a elas. O mais impressionante é que são capazes de possuir uma espécie de memória imunológica, ou seja, quando ela entra em contato uma segunda vez com o mesmo tipo celular estranho ao qual foi exposta antes, a reação é ainda mais rápida que da primeira vez. As esponjas também conseguem, mesmo sem um sistema nervoso, coordenar a ação em diferentes áreas do seu corpo, para realizar locomoção e regular o fluxo de água no seu compartimento central, o que é feito principalmente por sinalizadores químicos enviados através do seu sistema aquífero (vídeo ao lado). Desde Aristóteles já eram mencionadas movimentações no corpo das esponjas. Ou seja, o fato de não ter tecidos especializados não quer dizer que elas não emitam sinalizações, se movimentem ou percebam o ambiente, só faz com que essas ações não sejam tão rápidas ou precisas.

Por não possuírem sistema locomotor algum, nem tecidos organizados, os movimentos das esponjas são muito lentos e diminutos, como você pode ver no vídeo acelerado.

As esponjas são filtradoras. Por conta disso absorvem a água por poros localizados na sua parede, bombeando-a para o espaço interno chamado ósculo. Nesse processo que ela se alimenta, como você deve saber. Mas o que você talvez não saiba é que ela utiliza essa corrente de água que produz no ósculo para enviar sinalizações (hormônios, por exemplo) para outras áreas do corpo. como ela não tem sistema de circulação interno, usa o fluxo de água oscular para comunicar quimicamente. 

Os Cnidários, os primeiros animais com sistema nervoso

Como vocês viram, as esponjas (Filo Porifera) não possuem tecidos organizados, então não têm um sistema nervoso. Não tem nenhum sistema organizado, na verdade. Já os cnidários, grupo representado pelas águas vivas, corais e anêmonas, já possuem células organizadas em tecidos verdadeiros, especializados. São, portanto, os animais mais simples a possuírem sistemas! Seu sistema nervoso não é centralizado, como em organismos que surgiram mais tarde, como os platelmintos, minhocas, insetos, mamíferos, etc. Um sistema nervoso (SN) centralizado significa ter uma região do corpo que concentra a maior parte das funções nervosas e/ou coordenam e processam os estímulos nervosos que estão espalhados pelo corpo. Essa região é normalmente chamada de cabeça. Animais sem sistema nervoso centralizado, como os cnidários, não possuem, então, uma diferenciação clara no corpo do que é cabeça e o que não é. Atenção aqui na distinção que eu vou fazer agora: os cnidários possuem nervos e músculos autênticos, possuindo então um sistema nervoso; entretanto, esse sistema não é centralizado, o que faz que não possuam uma região destacada como “cabeça”. Só olhar nas fotos ao lado e vai entender o que digo! Chamamos o sistema nervoso dos cnidários, portanto, de difuso. Isso implica no que vocês podem ver no vídeo ao lado e que eu explico a seguir. Na maioria dos cnidários, neurônios interconectados formam uma rede nervosa difusa, ou seja, bem espalhada pelo corpo. Nesse grupo, os impulsos nervosos gerados na rede de neurônios de condução lenta podem ser espalhados em ambas as direções (“de lá pra cá e de cá pra lá”) ao mesmo tempo, ou seja, se irradiam em uma ou mais direções, fazendo com que a estimulação de uma célula sensorial em uma região específica se propague por todo o corpo do animal. Ou seja, é uma transmissão de sinais um pouco mal direcionada, que não dá a exata localização do estímulo. Já a rede nervosa de condução rápida, que normalmente fica por baixo do epitélio desses animais, tem uma transmissão mais rápida e direcionada dos sinais nervosos, justamente por ter uma espessura muito maior das fibras nervosas. Alguns estudos indicam que a espessura maior das fibras dessa rede de condução rápida é resultado da fusão de fibras menores durante o desenvolvimento embrionário desses animais. Esse é um lindo quadro pintado pela Evolução Biológica, né? Muitas vezes "novas" características surgem por uma simples mudança ou rearranjo de estruturas que já existem. Ao lado, poderão ver vídeos que exemplificam a interação dos estímulos nervosos dos cnidários com os seus tecidos musculares, gerando movimentação, seja para se alimentar ou para fugir.

Platelmintos, os primeiros sistemas nervosos centralizados

A novidade evolutiva dos Platelmintos é o sistema nervoso centralizado. Olhando a foto ao lado você percebe que existe uma diferença entre o que é cabeça e o que não é. Ué, como assim você não vê diferença? Veja a imagem do esquema interno do sistema nervoso dos platelmintos, então, para ter certeza.. Pois a maioria deles têm sim algo que podemos chamar de cabeça e algo que podemos entender como um cérebro primitivo. Esse cérebro é conectado a um ou mais pares de cordões nervosos que percorrem desde a região anterior (da cabeça) até a região posterior (do “rabo”). O sistema nervoso dos platelmintos é, então, chamado de ganglionar, já que esses cordões que percorrem seu corpo longitudinalmente concentram "nódulos" de neurônios de tempos em tempos. Esses "nódulos" vamos sempre chamar de gânglios, beleza? Agora, falando já de órgãos do sentido bem incipientes, algumas classes de platelmintos apresentam um ou mais pares de ocelos na região da cabeça, que são órgãos da visão primitivos, sensíveis à luminosidade e que guiam a movimentação desses animais. Ocelos não são olhos. São ocelos.

Os Platelmintos também possuem células com sensibilidade para substancias químicas, mudanças de pressão e estímulos mecânicos. Ao que parece, existe uma relação de causa e efeito entre sistemas nervosos mais complexos e formas diferentes de explorar o meio. Como você deve lembrar, as esponjas são organismos praticamente imóveis. Isso por que o sistema nervoso está relacionado não só com a complexidade do organismo como um todo, mas também por ele coordenar muitos dos processos metabólicos. Então o desenvolvimento de um sistema nervoso capaz de coordenar movimentos e respostas para os estímulos do meio está envolvido com o desenvolvimento de um sistema de locomoção mais elaborado, bem como a reprodução, alimentação, já que os órgãos do sentido auxiliam todas essas funções. Um sistema bem semelhante a este que estudamos é encontrado no grupo dos Nematelmintos.

Nos moluscos, que é um grupo muito diverso, existem animais com Sistemas Nervosos (SN) muito simples e outros com o SN extremamente elaborados. Alguns moluscos nem cordões nervosos têm; já outros, como os cefalópodes (grupo das lulas e polvos) têm a capacidade de mudar de cor e elaborar estratégias incríveis de predação. Veja alguns vídeos que eu separei ao lado, para dar a dimensão disso! De uma forma geral, dentro de qualquer grupo animal, a organização do sistema nervoso está correlacionada com o estilo de vida daquele grupo. Exemplo, moluscos que são sésseis, ou seja, que ficam paradões lá na areia, têm órgãos de sentido bem simples e não têm (ou têm pouca) cefalização. Agora, polvos e lulas têm olhos grandes que formam imagens, cérebro com milhões de neurônios e são capazes de executar tarefas complexas, como mimetismo e elaborar armadilhas.

Designes de Sistemas Nervosos

Há cerca de 500 milhões de anos ocorreu um processo na história geológica muito importante, chamado Explosão Cambriana. Nesse período uma quantidade muito diversa de organismos vivos surgiu, o que é confirmado pelos fósseis datados dessa época. Junto com as novas espécies, surgiram sistemas especializados de neurônios, permitindo uma resposta mais rápida e direcionada para os estímulos ambientais: Sistemas Nervosos cada vez mais sofisticados. Os neurônios (células básicas de um sistema nervoso) agrupados formam o que chamamos de nervos, ou fibras nervosas. Essas fibras conduzem informações sobre o mundo à volta do organismo, como intensidade e direção da luz, substâncias químicas, estímulos mecânicos (toque, impactos etc) e físicos (calor, movimento, etc). Os sistemas nervosos foram, ao longo da evolução, se especializando e diferenciando de modo a serem mais efetivos e precisos. Como comentamos, a cefalização é um importante passo nesse sentido, já que concentram neurônios sensoriais e interneurônios na região que passamos a chamar de cabeça. Mas a cefalização é uma consequência de um tipo de arranjo corporal específico: simetrias bilaterais. Em termos gerais, somente animais com simetria bilateral têm cabeça. Pense num animal como a água viva, como a estrela do mar, como uma anêmona (foto). Esses que citei são animais de simetria radial, ou seja, você consegue dividir o plano corporal deles em diversas seções transversais, como uma pizza. Pense em animais como os platelmintos, cavalos, polvos e seres humanos. Esses são exemplos de animais de simetria bilateral, ou seja, aqueles que o corpo pode ser dividido em duas partes mais ou menos iguais. É só você fazer aquela velha brincadeira de pegar um espelho e colocar no meio da sua cara. A bilateralidade tem muito a ver com o processo de cefalização e sofisticação dos sistemas nervosos ao longo da evolução. Pense: dividindo sua face ao meio, você tem um olho em cada lado, um ouvido em cada lado, uma narina em cada lado. Certo? Essa duplicação dos órgãos do sentido, no seu elaboradíssimo sistema nervoso, te dão a capacidade de triangular a posição de objetos à sua frente. Falo triangular no sentido de ter a exata dimensão, com noções muito exatas de profundidade e distância, de onde estão os objetos em determinado ambiente. Pense no valor disso para localizar fontes de alimentos e possíveis perigos. Muita, né? Então dá pra entender por que características assim foram positivamente selecionadas pelo processo evolutivo!

Visão geral do Sistema Nervoso dos Vertebrados

O Sistema Nervoso dos vertebrados é organizado num Sistema Nervoso Central (SNC), composto pelo cérebro e medula espinhal, e em um Sistema Nervoso Periférico (SNP), composto pelos nervos cranianos, nervos espinhais e gânglios espalhados por todo o corpo. Nós identificamos um animal vertebrado pela presença de uma coluna vertebral, certo? Justamente, dentro dessa coluna, que é óssea, passa a medula espinhal. Essa medula vai conduzir informação tanto do cérebro pro corpo quanto do corpo para o cérebro no que diz respeito à locomoção do animal. Por isso que pessoas que se envolvem em acidentes e tem lesões graves na coluna perdem parte ou integralmente a capacidade de se locomover (chamamos sua condição de paraplegia ou tetraplegia). Você vai ver mais sobre a medula quando estivermos falando de como funciona o reflexo.

Já o Sistema Nervoso Periférico (SNP) tem um papel importante na regulação do ambiente interno do animal, que envia e recebe informações do SNC por meio de neurônios aferentes e eferentes, respectivamente. Um nervo (um conjunto de neurônios) do SNP contém tanto neurônios aferentes quanto eferentes. É importante separar a direção da informação em feixes de neurônios diferentes para garantir que a informação não se confunda ou se perca. É como se fosse uma avenida de carros. Se você usa uma rua com uma única faixa para carros irem e voltarem a chance de um acidente ou engarrafamento acontecerem é de 1000%. Agora, se você tem uma via de ida e uma de volta, o fluxo anda e toda informação chega ao seu destino, certo?

Como você já entendeu, os neurônios eferentes do SNP conduzem uma informação do SNC para algum outro lugar, certo? Podem ser dois os destinos dessa informação: o sistema motor ou o sistema nervoso autônomo. O Sistema Motor é aquele responsável pelo controle da sua musculatura esquelética (os músculos que realizam movimentos voluntários), que são basicamente o que você vai malhar na academia. O Sistema Motor coordena todo o conjunto de musculaturas que te ajuda a se mover (por isso chama motor). O outro, Sistema Nervoso Autônomo, coordena a musculatura e funções involuntárias do seu corpo: secreção de hormônios, controle da musculatura lisa (que reveste teus órgãos internos), controle do coração e tudo mais que não depende da tua vontade. Já viu alguém malhando estômago na SmartFit? O SNP leva a informação até os músculos, glândulas e etc, mas quem envia a informação mesmo é o SNC, o big boss.

Evolução do cérebro nos Vertebrados

Se você for observar a evolução do cérebro nos vertebrados, é melhor que observe a partir das mudanças nas regiões do cérebro: prosencéfalo, mesencéfalo e rombencéfalo. Parece o nome de filhos trigêmeos de pais com gosto discutível, mas não: são separadas em regiões pois possuem funções diferentes. O prosencéfalo é a região que contém o bulbo olfatório, que processa informações olfatórias (óbvio), ou seja, 'cheiro', e o córtex cerebral, que lida com o sono, aprendizagem e qualquer função complexa. O mesencéfalo lida com a maioria das informações sensoriais. Já o rombencéfalo, que forma o nosso cerebelo, coordena atividades involuntárias do seu corpo. Agora, porque será que saber a função dessas áreas te ajuda a entender a imagem ao lado? Pelo seguinte motivo: observe os actinopterígeos. São peixes que exploram o ambiente usando olfato, visão e outros componentes sensoriais para detectar muitas informações desse meio. Então, neles, uma região como o bulbo olfatório e o mesencéfalo são de extrema importância. Diferente do córtex cerebral, que na região do prosencéfalo é a responsável pelas atividades complexas. Compare com o dos mamíferos. "A correlação entre o tamanho e a função de regiões do cérebro também pode ser observada considerando-se o cerebelo. Peixes actinopterígeos de nado livre, como o atum, controlam o movimento em três dimensões na água aberta e apresentam um cerebelo relativamente grande [o cerebelo também está relacionado com o equilíbrio e azimute]. Em comparação, o cerebelo é muito menor em espécies que não sabem nadar ativamente, como a lampreia. Se compararmos aves e mamíferos com grupos que divergiram do ancestral comum dos vertebrados no início da evolução, duas tendências são evidentes. 

Em primeiro lugar, o prosencéfalo de aves e mamíferos ocupa uma fração maior do cérebro comparado aos anfíbios, peixes e outros vertebrados. Em segundo lugar, as aves e os mamíferos apresentam cérebros muito maiores em relação ao tamanho do corpo do que os outros grupos. De fato, a razão do tamanho do cérebro com o peso corporal é dez vezes maior para as aves e mamíferos em comparação aos seus ancestrais evolutivos. Essas diferenças no tamanho total do cérebro e o tamanho relativo do prosencéfalo refletem a maior capacidade de aves e mamíferos à cognição bem como um raciocínio superior" (Reece, 2010).

Cérebro humano: o que há de tão especial?

Vou pegar o conceito emprestado de Yurval Harari quando ele usa o nome "humano" para se referir a todas as espécies que compõem o gênero Homo. Dentre elas, sim, o Homo sapiens (nós), mas também o Homo neanderthalensis, Homo erectus, Homo habilisHomo rudolfensis, Homo soloensis, Homo ergaster, Homo nalediHomo denisova, dentre tantos outros. Afinal, humano vem de "aquele que pertence ao gênero Homo". Ao lado você pode ver uma imagem de crânios de alguns dessas outras espécies humanas. Vamos chamar nossa espécie simplesmente de... Sapiens. Esse é o nome do livro mais famoso do Harari, que é maravilhoso, aliás. Ele nos lembra um fato interessante: há 10 mil anos atrás, pelos menos 6 espécies humanas diferentes povoavam a Terra simultaneamente. Todas capazes de produzir ferramentas para caçar, relacionarem-se de forma complexa com o restante do grupo, etc. O que diferencia os humanos do resto dos animais é essencialmente o tamanho do cérebro em relação ao corpo, mais especificamente, do córtex pré-frontal. Mamíferos de 60kg normalmente têm um cérebro de 200 m3 de volume. Os primeiros humanos, surgidos há 2,5 milhões de anos, tinham cérebros de 600 m3. Sapiens têm cérebros de 1.400 m3. Neandertais? Esse número é ainda maior.

O cérebro, como você deve imaginar, é o órgão que mais consome energia no nosso corpo. Ele consome cerca de 6kcal por dia para cada bilhão de neurônios. No nosso caso, com 86 bilhões, ele consome mais de 500kcal. Numa dieta de "2 mil kcal/dia", isso é de 1/4. ou seja, 25% da energia que você come vai para o seu cérebro simplesmente... funcionar. Então, basicamente, ter um cérebro grande, capaz de realizar tarefas complexas, ter consciência, sentimentos, desenvolver arte, cultura, linguagem, coordenação motora fina e tudo mais, envolve um consumo calórico absurdo.

Para resolver a tendência de cérebros grandes e altamente custosos energeticamente, a solução evolutiva pode ser: abreviar o crescimento de outras regiões do corpo ou passar praticamente todo o tempo que está acordado, comendo. As duas são desinteressantes sob o ponto de vista prático. Então, a grande revolução apontada pela neurocientista brasileira Suzana Herculano-Houzel na palestra ao lado e discorrida com mais detalhes no seu livro é que com o advento do cozimento, humanos conseguiram acessar de forma mais eficiente as calorias dos alimentos que ingeriam. Os sapiens e os neandertais usavam fogo diariamente há pelo menos 300 mil anos. Isso parece ter relação direta com o cérebro excepcionalmente grande nessas duas espécies. A questão do cozimento foi importante para passar menos tempo mastigando, o que gerou modificações nos dentes humanos (bem distinto dos primatas não-humanos), além de acessar alimentos que antes não faziam parte da nossa dieta, por serem muito duros.

Mas outra questão importante que não pode ser deixada de lado é que se o cérebro é o maior consumidor de energia do corpo humano, o trato digestivo (intestino, em especial) não fica pra trás. Sabe aquele sono pós-almoço? Culpa do seu intestino que está trabalhando e "roubando" energia do cérebro. Portanto, se os alimentos são de mais difícil digestão (crus), adaptativamente os intestinos são mais longos, para ter mais espaço para obter nutrientes e quebrar aquelas moléculas. Com o cozimento e os nutrientes mais acessíveis, intestinos mais curtos não foram um problema. Se intestinos são órgãos que gastam muita energia, e o cozimento pode permitir sua redução, isso sem dúvida foi mais um fator que abriu espaço para o crescimento do cérebro (seu maior rival em consumo de energia).

Livros Recomendados

Neurônios e Neuróglias

Basicamente os sistemas nervosos consistem em “circuitos” de dois tipos de células: neurônios e neuróglias. Também podemos chamar as neuróglias de células da glia ou células gliais. Se você já fez cursinho de inglês vai se lembrar que a tradução de “cola” é glue (pronuncia-se glú, com biquinho de francês). Os nomes não se parecem atoa: neuróglia tem a tradução literal do grego-português para “cola do nervo”. Acredita-se que as células da glia contribuem para a função encefálica sobretudo por isolar, sustentar e nutrir os neurônios vizinhos. De uma forma simples, se o encéfalo fosse um cookie e os neurônios gotas de chocolate, a glia seria a massa que preenche todos os espaços e assegura que as gotas de chocolate fiquem suspensas no lugar certo. Mas dizer apenas isso seria demonstrar ignorância sobre a variedade imensa de funções que os vários tipos de células da glia podem possuir. Sabemos que no encéfalo humano existem 86 bilhões de neurônios e a mesma quantidade de células da glia. Então vamos estudar os dois tipos celulares do sistema nervoso (neurônios e neuróglias) sem ignorá-las, pois afinal, sem elas não haveria sequer a formação do Sistema Nervoso Central. Digo isso pois um tipo de célula da glia chamada Glia Radial é quem forma os sulcos no embrião para neurônios migrarem para a região da cabeça e formarem o encéfalo. Tem células da glia conhecidas como Astrócitos que são responsáveis pela formação da barreira hematoencefálica, que é uma barreira química que protege o encéfalo de entrar em contato com as substâncias que estão circulando no sangue. Imagina só se tudo que circulasse no seu sangue fosse parar no cérebro. Você não estaria aqui lendo esse site, certamente. Vamos falar mais dela futuramente, não se preocupe. Tanto a Glia Radial quanto os Astrócitos podem desempenhar o papel de célula-tronco no encéfalo, dando origem a neurônios na fase inicial de formação do organismo! Os oligodendrócitos são um dos tipos de células da glia que atua para formar a bainha de mielina, aquela "capa" protetora dos axônios, que garante a transmissão de impulsos nervosos, sabe? Sem ela, desenvolvem-se doenças como a Esclerose Múltipla. Outro tipo de célula da glia importante são as microglias, que atuam como células de defesa no cérebro, localizando e digerindo células invasoras, como bactérias. Como pudemos ver, então, as células da glia têm uma função muito maior do que só preencher espaço e nutrir os neurônios. Elas atuam diretamente nos processos nervosos e na formação desse sistema no período embrionário.

Ao lado você pode conferir um esquema que alguns tipos de células da glia diferentes, com funções distintas e de suma importância para a formação e mantimento normal do sistema nervoso.

Todo mundo conhece o formato de um neurônio. As regiões, como todos sabemos são o Soma, Dendritos e Axônio. A membrana citoplasmática dos neurônios recebe um nome especial: membrana neuronal. Isso por conta de algumas diferenças em relação à membrana de outros tipos celulares. 

Vamos começar falando do Soma, que também é conhecido como corpo celular. Nessa região encontramos as organelas e o núcleo imersos no citoplasma. Um neurônio produz proteínas e energia como qualquer outra célula, usando organelas como mitocôndrias, ribossomos, RER, REL, Complexo de Golgi e o núcleo. No corpo celular (soma), portanto, encontramos estruturas comuns à maioria das outras células, nada muito difícil de entender. A principal diferença em termos de estrutura são os dendritos e axônios. Os dendritos são ramificações do corpo celular responsável por captar os estímulos advindos de outros neurônios. Já o axônio é responsável por transmitir o impulso recebido aos próximos neurônios. O axônio é uma região distinta no neurônio principalmente por dois motivos: sua membrana é diferente da membrana neuronal e ele não possui Retículo Endoplasmático Rugoso ou Ribossomos livres, ou seja, nessa região não ocorre síntese proteica. Então, as proteínas que atuam nessa região são sintetizadas lá no soma! E olha que essa viagem pode ser bem grande: os axônios podem ter desde um milímetro até um metro de comprimento. Sim, um metro, o que rende para ela o título de célula mais longa do corpo humano. O axônio dos neurônios ainda podem se ramificar, aumentando ainda mais o alcance da informação. Estima-se que um neurônio, através das suas ramificações, pode transmitir o sinal para outros mil neurônios, simultaneamente.

No final dos axônios vemos estruturas com formato semelhante à patas de elefante, que chamamos de botão terminal. Ali é um local extremamente importante, pois guarda os neurotransmissores dentro de vesículas, que ela solta para transmitir o impulso a outro neurônio. A transmissão de impulsos ocorre basicamente da seguinte forma: o sinal percorre um neurônio eletricamente e quando chega no final, esse impulso promove a liberação de neurotransmissores que comunicam quimicamente o próximo neurônio, gerando um impulso elétrico que vai percorrer todo o seu axônio e assim por diante.

Os neurônios são células altamente especializadas que, durante sua formação, perdem a capacidade de sofrer mitose e gerar novos neurônios. Assim, é comum ocorrer perda gradativa de algumas funções nervosas conforme o envelhecimento. Quando um conjunto de neurônios morre, por alguma razão, não é possível regenerá-los naturalmente. Então, a pessoa acaba perdendo a função que aquele neurônio executava. Podem ser neurônios auditivos, visuais, por exemplo. Se for o caso, a pessoa começa a escutar e enxergar mal (o que normalmente acontece quando alcançamos idades mais avançadas). O mesmo pode acontecer para a movimentação muscular e a memória. Vamos conhecer um pouco melhor a estrutura dos neurônios, pois assim podemos entender como os fenômenos nervosos e algumas doenças ocorrem.

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Quem disse que só usamos 10% do nosso cérebro?

Existe um mito muito difundido de que o ser humano só utiliza 10% do cérebro.

Impulso nervoso através dos axônios

Você deve ter na cabeça algo como um “impulso” ou a ideia de algo “elétrico” sendo transmitido, quando o assunto é neurônio. Num neurônio, a membrana plasmática é especialmente rica em proteínas de canal. Se não sabe o que é, vai lá na sessão de citologia. As proteínas de canal são importantes pois permitem a passagem de substâncias entre os meios interno e externo, lembra? Então, essas proteínas podem fazer esse transporte passivo mediante diversos tipos de estímulo. Pode ser estímulo eletroquímico (como é o caso dos canais do tipo “voltagem-dependente”) ou pode ser por estímulo de um ligante (canais ligante-dependente), pra ficar só nos dois tipos mais importantes. Já vamos explorar melhor como esses canais funcionam, tá? É que antes preciso te explicar uma coisa sobre as membranas celulares. Elas normalmente têm uma “d.d.p”. Esse conceito é lá da física, significa diferença de potencial. Isso é o mesmo que dizer que a composição eletroquímica do interior da célula é diferente da do exterior, gerando uma diferença de carga entre esses dois ambientes. O papel da membrana aqui não é o de equilibrar esses dois meios, mas sim de manter essa diferença. É muito comum ouvir que “a natureza sempre busca ao equilíbrio”, mas você está aprendendo aqui agora que, na verdade, existem certos “desequilíbrios” que são vitais para nós. Manter as concentrações desiguais de determinados íons como Na+, K+) possibilita a existência dessa d.d.p. e, no final, é o que faz ser possível a realização de diversas funções metabólicas celulares, como a contração muscular e a transmissão de impulsos nervosos. Como aqui a gente não dá ponto sem nó, quero te dizer exatamente qual é essa diferença de composição entre o meio interno e externo da célula que faz essa d.d.p existir. Basicamente, o meio interno é mais negativo e o meio externo é mais positivo. E o motivo disso, na verdade, são 3 motivos:

1) A maioria dos elementos dentro da célula estão na forma ionizada, incluindo as proteínas, que em sua maioria estão aniônicas, por conta do meio aquoso. Isto reforça a maior concentração de cargas negativas no interior da célula.

2) Ocorre uma assimetria lipídica. Como você sabe as membranas plasmáticas são compostas por uma bicamada de fosfolipídios. Então, há uma camada voltada para a região interna da célula e uma para a externa. A composição da camada interna e externa de fosfolipídios é diferente, sendo a interna mais rica em um tipo de fosfolipídio chamado fosfatidilserina, que é negativamente carregado. Então, isso faz com que a camada interna seja mais eletronegativa.

 

3) A Bomba de Sódio e Potássio, que fica inserida na membrana, realiza transporte ativo de 2 moléculas de Sódio (Na+) para cada 3 de Potássio (K+). Ou seja, saem 3 cátions para entrada de apenas 2 cátions; Assim, é de se esperar que o meio externo vá ficando mais positivo, certo? Estimamos que a diferença de potencial média gerada pela bomba seja de -4mV.

Somando-se essas três causas, a diferença de potencial (ddp) total é de -90mV. A essa ddp damos o nome de Potencial de Repouso. Ou seja, uma célula em repouso, sem realizar nenhum estímulo ou ação metabólica específica, tem uma diferença de potencial de -90mV, só por conta desses três motivos que eu citei acima.

 

Então agora que você já entendeu como uma membrana possui diferença de potencial, você é capaz de entender como funciona um canal voltagem-dependente. Quando a ddp é de -90mV (potencial de repouso), o canal fica lá, fechado, não deixa nada passar pra um lado nem para outro. Entretanto, quando a ddp atinge determinado valor, ele abre, deixando íons passarem. Entendeu? Algo parecido acontece com um canal ligante-dependente. Ele fica lá, tranquilo, fechadão. Quando alguma molécula específica se liga a ele, ele abre, deixando passar seja lá o que ele permita passar. Vale lembrar que os canais, seja de qual tipo forem, são altamente específicos, ok? Se é um canal de sódio, só passa sódio. Se é um canal de cálcio, só passa cálcio. Então não é por que ele abriu que entra tudo: cálcio, sódio, um fandangos, tua avó, o faustão. Nada disso. Canais são específicos, não se esqueça disso.

Então vamos ao que interessa: já dissemos que os neurônios podem ser células enormes, com axônios que chegam a metro de comprimento. Como diabos um neurônio transmite uma informação ao longo de tooooooodo comprimento de seu axônio? Justamente, por impulso elétrico. Mas como assim? Já chegamos à conclusão que a célula tem uma ddp quando está em repouso, certo?

1) O impulso é gerado quando o neurônio entra em contato com um neurotransmissor (pode ser a acetilcolina, por exemplo). Esse neurotransmissor é um ligante de um canal chamado “Canal para Sódio Acetilcolina-Dependente”. Calma, vou explicar: ao entrar em contato com esse ligante (esse é um canal ligante-dependente), o canal se abre e permite a entrada de sódio. Mas se o sódio entra, a diferença de potencial da membrana vai reduzir, certo? Por que ela era mais negativa na parte de dentro e agora está entrando sódio, que é um íon positivo. Então a ddp sai de -90mV e vai para -60mV. Aí que o bicho pega:

2) Agora que a ddp atingiu determinado limiar (vamos chamar o valor de -60mV de ‘limiar de excitação’), uma segunda proteína chamada “Canal para Sódio Voltagem-Dependente” vai abrir e permitir a entrada de um caminhãão de sódio na célula, levando a ddp de -60mV a +35mV. Esse momento chamamos de despolarização. Sabe porque? Por que antes a parte de fora era mais positiva que a de dentro e agora, com a ação desses dois canais, a parte de dentro da membrana está mais positiva. Então você despolarizou a membrana. Beleza. Logo depois de despolarizar esse canal Voltagem-dependente se fecha também.

3) Essa despolarização ativa um terceiro canal chamado “Canal para Potássio Voltagem-Dependente”, que vai expulsar à força (to querendo dizer aqui que o transporte é ativo) quase todo o potássio pra fora da célula, restabelecendo a ddp inicial. Esse momento é chamado de repolarização.

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É claro que tudo isso acontece em um espaço de tempo ridículamente curto. Cerca de três milisegundos é suficiente para uma parte da membrana se despolarizar e repolarizar. É graças a essa rapidez que você não demora um sééculo pra tirar a mão de algo quente ou não demora cem anos pra somar 2 + 2. Todo esse processo que eu descrevi está resumido abaixo e demonstrado nos gráficos, imagens e vídeos ao lado.

Resumo da dinâmica dos canais
1 – Canal para Sódio Acetilcolina-Dependente

> Função: Fazer que entre Na+ até que se chegue à d.d.p correspondente ao Limiar de Excitação.

> Tipo de transporte: Passivo

> Tipo de Canal: Ligante-Dependente

> Íon transportado: Sódio

 

2 – Canal para Sódio Voltagem-Dependente

> Função: Fazer que entre Na+ de forma rápida até que se atinja o Potencial de Ação.

> Tipo de transporte: Passivo

> Tipo de Canal: Voltagem-Dependente (-60)

> Íon transportado: Sódio

 

3 – Canal para Potássio Voltagem-Dependente

> Função: Fazer que saia potássio da célula suficiente para restabelecer a condição elétrica.
> Tipo de transporte: Passivo
> Tipo de Canal: Voltagem-Dependente (-60)
> Íon transportado: Potássio

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Do botão terminal para o dendrito do próximo neurônio

Quando chega ao final do axônio, como você já sabe, temos os botões terminais, que se comunicam com os dendritos de outros neurônios. Nos neurônios mais eficazes, a sinapse (transmissão de informação entre um neurônio e outro) é química. Isso significa dizer que os neurônios não se encostam, mas se comunicam por mensageiros químicos, que chamamos de neurotransmissores.

Depois de todo aquele processo acontecer e o impulso percorrer todo axônio do neurônio, ele vai parar no botão terminal, que é rico em vesículas (2) com neurotransmissores dentro. Ao chegar o estímulo, os neurotransmissores são liberados (7) e se ligam aos canais ligante-dependente (5) do axônio do próximo neurônio, iniciando o estímulo nele. Todo esse processo é chamado de sinapse. A distância entre os botões terminais de um neurônio e outro nós chamamos de fenda sináptica (4). O neurônio que transmite a informação é chamado de pré-sináptico (A) e o que o recebe é chamado de pós-sináptico (B). Ou seja, aquele antes e aquele depois da sinapse.

Sistema Nervoso na prática: algumas funções cotidianas

Bem, até agora falamos bastante sobre a organização do sistema nervoso, sobre os neurônios, neuróglia, sobre como as informações nervosas são transmitidas, mas não falamos tanto sobre como isso tá no teu dia-a-dia. Mas agora, vamos começar a entender como essas estruturas atuam nas tuas funções cotidianas, como reflexo, memória e emoções. Bora? Você pode só ir descendo e lendo ou ir direto para alguma função através do menu ao lado

O reflexo

Primeiro, acho necessário (em honra aos meus amigos da Educação Física) fazer uma distinção entre reflexo e tempo de reação. Muitas vezes estamos vendo um jogo de futebol incrível. Tá 0 a 0 na final e o juiz apita. Vai pros pênaltis. Hora de confiar no goleiro, né? Aí no momento do pênalti final ele pega! Todos comemoram e alguém grita: “NOSSA, QUE REFLEXO!”. PÉÉÉÉ. Errado. O goleiro, pra agarrar aquele pênalti contou apenas com um curto tempo de reação! Vou explicar a diferença.

O tempo de reação é o espaço de tempo até você visualizar a ação, enviar a informação para o cérebro e ele devolver a informação com uma resposta adequada. É uma resposta consciente e voluntária, que quanto mais rápida for, melhor será o goleiro (pra ficar no exemplo que estou dando). O goleiro viu a direção da bola e se movimentou rapidamente para ir naquela direção também. Tempo de reação é o que muito animais usam na hora da caça ou de fugir do predador também. Então, o que é o reflexo? Diferente do Tempo de Reação, o reflexo é involuntário e se aperfeiçoou evolutivamente como um mecanismo de defesa, muito mais rápido que o Tempo de Reação, por que ele não necessita do indivíduo tomar consciência do estímulo para responder. Vou dar um exemplo: quando você coloca a mão em algo quente, o movimento rápido de retirada é um reflexo. Normalmente, você tem um espasmo muscular para afastar a mão da superfície quente alguns milissegundos (o que pro sistema nervoso é uma eternidade) antes de esboçar reação consciente, como um grito de “aaaai diacho”.

Então agora vamos entender qual o caminho nervoso do reflexo, dando como exemplo aquele famoso teste do arco reflexo patelar. Aquele em que os médicos batem com um martelinho perto do joelho do paciente! 

Mas antes, você sabe pra que serve o reflexo patelar? Ele serve para te proteger de alguma tensão "surpresa". Por exemplo: você tá ajudando sua tia a carregar uma mesa da sala pra varanda. A mesa é levinha, você tá ajudando por que ela é grande e meio desajeitada. Aí, distraído daquele trabalho simples demais para suas enormes capacidades físicas, sua mente viaja e você começa a pensar na morte da bezerra. Eis que seu sobrinho que estava pulando no sofá resolve pular em cima da mesa. Essa intensa carga "surpresa" vai ser suportada pelo seu reflexo patelar. O que significa que no momento em que sua perna dobrar, a tensão sobre os seus joelhos desencadeia a contração do seu músculo da coxa (quadríceps), ajudando você a ficar em pé e suportar a carga. É um reflexo, logo, involuntário. Tem, portanto, a vantagem de ser mais rápido que os atos conscientes. Você já estará segurando a mesa antes mesmo de tomar consciência de que algo caiu sobre ela. No consultório médico, a "carga surpresa" é feita artificialmente pela batidinha com o martelo sobre o tendão conectado ao seu músculo da coxa. Ele vai promover uma contração desse músculo, que vai ser detectado por neurônios sensoriais. Estes, transmitirão a informação para a medula espinhal (lembra que ela lida com o movimento do corpo?), que retornará a informação através dos neurônios motores, ordenando o movimento de contração do músculo da coxa. Se você perceber, a ordem é exatamente a que estudamos lá em cima. Estímulo externo, receptores sensoriais, neurônio aferente, sistema nervoso central (nesse caso representado pela medula espinhal), neurônio eferente, sistema motor, controle da musculatura esquelética. Ou seja, ele é captado pelo SNP, processado pelo SNC e depois volta ao SNP para responder ao estímulo.

Reflexo

O sono

O sono é um estágio de inconsciência induzido pelo seu cérebro para que importantes processamentos aconteçam. Portanto, precisamos desmistificar umas coisas aqui: primeiro, o seu cérebro funciona durante o sono. Na verdade seu cérebro funciona inteiro, por 24h todos os dias, ininterruptamente. segundo, o sono é um estado de inconsciência e isso não significa que seu cérebro não recebe estímulos, somente que você não processa eles de modo a racionalizar conscientemente, sendo incapaz de memorizar e responder a estes estímulos. É no momento do sono, por exemplo, que o cérebro é desintoxicado, que ocorre um aumento da secreção do hormônio do crescimento (GH) e que algumas memórias de curto prazo se consolidam em memórias de longo prazo (somente aquelas que você julga ter importância). Vamos falar de memória um pouco mais pra frente! É no sono também que muitas coisas que aprendemos durante o dia, na escola, no trabalho ou se a pessoa amada gosta de café com açúcar ou adoçante são efetivamente registradas. O sono é essencial para a saúde do cérebro e ser privado dele pode tornar a pessoa altamente irritadiça, estressada, psicótica, violenta e incapaz de racionalizar coisas simples, como contas de somar e leituras que ela faria com facilidade em situações comuns. Vigília (ato de ficar acordado) e sono são controlados em parte pela formação reticular, uma rede de neurônios do mesencéfalo, e pela ponte. O sono também é regulado pelo relógio biológico e por regiões do prosencéfalo que regulam sua intensidade e duração.

Vou tentar partir de algo que você com certeza sabe: nosso sono, de certa forma, é regulado pela quantidade de luz. Isso que determina nosso "relógio biológico". Quando viajamos para um lugar com fuso horário muito diferente do que estamos habituados, temos problemas até nos acostumar. Então você sabe que o seu relógio biológico é conectado com os ciclos ambientais de luz e escuridão, certo? Nós chamamos isso de ciclo circadiano, por que ele se repete todos os dias (diano vem de dia). Esse ciclo é coordenado por um grupo de neurônios no hipotálamo, chamado de NSQ (ou SQN, se for em inglês). Vou nem te falar o nome todo desse grupo de neurônios para não te assustar. Vamos ficar com NSQ mesmo. O que acontece durante o dia é que a sua retina está continuamente recebendo estímulo luminoso da luz solar e ela estimula constanemente os NSQ. Esses neurônios (NSQ) têm o poder de inibir a produção de melatonina, o famoso hormônio do sono, lá na glândula pineal. Quando o estímulo luminoso diminui (à noite), a retina para de estimular o NSQ e eles param de inibir a produção de melatonina pela glândula pineal. Então os níveis desse hormônio sobem e você sente sono. a importância do estímulo luminoso é tão grande que pessoas que são deixadas em ambientes inteiramente iluminados ou escurecidos 24h por dia desenvolvem problemas de sono desde o primeiro dia. Ou isso ou serem continuamente mantidos acordados, inclusive, já foi método de tortura.

Tem um outro hormônio importante nessa brincadeira que é a adenosina. Ela é como se fosse um produto secundário do nosso metabolismo neuronal. Quando ela se acumula, gera diminuição da atividade nervosa por que ela inibe a secreção de neurotransmissores (que são a maneira na qual os neurônios transmitem informações quimicamente uns aos outros, lembra?). No embalo de diminuir a atividade em diversas regiões do cérebro, ela acaba diminuindo também a atividade dos neurônios NSQ, lembra deles? Aí, de novo: sono. Ao dormirmos, ela é removida do nosso corpo.

E aqui que entra a história do café: O café tira nosso sono por que algumas de suas substâncias bloqueiam os receptores do cérebro que a adenosina se liga. Então ela não consegue fazer o trabalho dela de diminuir a atividade neuronal pra te induzir ao descanso. Então o café não é uma bebida energética, ele só impede que os seus mecanismos naturais de sono atuem bem, deixando você artificialmente acordado.

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Sono

Lutar ou fugir

É muito flagrante a necessidade de animais desenvolverem uma resposta nervosa para os momentos de lutar ou fugir. Porque esses momentos demandam tudo de nós, já que nossa vida provavelmente está em jogo. Nesses momentos, é preciso uma ação coordenada, onde o corpo converta toda sua energia para aquela ação. O cara responsável por isso, claro, é o nosso Sistema Nervoso. Voltando de novo naquele nosso esquema que já vimos várias vezes, o SNP recebe ordens do SNC, que podem ser para agir no sistema motor ou no sistema nervoso autônomo, responsável por toda a parte involuntária, certo? Então, as divisões simpatica e parasimpática são sempre opostas nos seus comandos, então ou uma está coordenando o funcionamento dos órgãos e vísceras ou a outra está. Se uma manda abrir, a outra manda fechar. Aí que mora o pulo do gato. Vamos supor que você é um sapiens de 15 mil anos atrás. Aí você está lá no medio oriente e vê um leão imenso, que parece estar faminto. Ele vê em você um pedaço de bife suculento e começa a correr atrás de você. Aí, você rapidamente desenvolve uma resposta de luta ou de fuga? Bom, eu digo fuga, não sei você.

Então vamos entender o que ocorreu aqui? Acompanha junto com a imagem: Estímulo externo visual (você viu o leão), essa imagem foi levada pelo seu par de nervos cranianos ópticos (neurônio aferente) ao seu cérebro (SNC), que através de neurônios eferentes enviou tanto a informação para o sistema motor mandando você correr muito, usando sua musculatura esquelética, tanto quanto para o seu sistema nervoso autônomo, mais especificamente para a sua divisão simpática. A divisão simpática estimula ações como por exemplo: 1) aceleração de batimentos cardíacos, útil para levar sangue mais rápido à sua musculatura, que agora está em intensa atividade; 2) inibição da digestão, que é interessante pois essa atividade demanda muita energia e você tem que direcionar toda energia agora para o cérebro e musculatura; 3) o fígado começa a converter glicogênio em glicose, gastando o estoque glicídico de energia para aumentar a glicemia do sangue e a geração de energia nas células. 4) as glândulas suprarrenais aumentam a secreção de epinefrina (adrenalina),  que é um neurotransmissor. Quanto mais neurotransmissor tiver, mais informação nervosa é transmitida; 5) dilatação de pupilas, o que é bom para luta/fuga por que entra mais luz pela pupila, permitindo que se enxergue melhor. Pra ficar em somente cinco exemplos. Quando você já estiver bem longe do leão, a divisão parassimpática vai predominar e enviar todos estímulos opostos.

Há uma diferença entre os neurotransmissores liberados pelos neurônios da divisão simática e da parassimpática. que permite às divisões simpática e parassimpática. Aqueles da divisão parassimpática liberam acetilcolina, enquanto seus homólogos na divisão simpática, liberam norepinefrina. Essa diferença é capaz de produzir efeitos opostos em órgãos como pulmões, coração, intestino e bexiga.

Luta ou fuga

Os sentidos

1) Sentidos Químicos: paladar e olfato

Os sentidos químicos trabalham a partir da percepção de moléculas químicas, estejam elas pairando pelo ar, sendo percebidas pelo olfato, estejam elas entrando em contato com a nossa boca, sendo percebidas pela gustação. Para animais aquáticos, não há distinção entre gustação e olfato. No sentido de antiguidade, as sensações químicas são as mais antigas e comuns nos sistemas vivos, já que, por exemplo, pela presença de determinada substância diluída na água, uma bactéria pode dirigir-se para perto ou para longe da região onde está mais concentrada (quimiotropismo positivo ou negativo, respectivamente). Mas claro, a tendência dos sistemas vivos, no sentido evolutivo, é a de se organizar e potencializar a efetividade das suas funções. As funções nervosas responsáveis por perceber e interpretar esses sinais do ambiente não são diferentes disso. Surgem, para tal, órgãos do sentido. Esses órgãos (olhos, línguas, narizes, etc) são especializados, cada um da sua forma, em receber um tipo de informação do meio, que podem ser informações químicas (como o olfato e gustação), vibrações (audição), toques (tato) ou variações na intensidade luminosa (visão). Quanto mais especializados os órgãos do sentido, mais o cérebro deve ser capaz de interpretar e processar essas informações, portanto, o nosso sistema sensorial, por exemplo, demanda um cérebro incrível (e nós o temos). Vamos começar falando um pouco sobre os sentidos químicos e depois falar de audição, tato e visão.

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O paladar é a capacidade de perceber moléculas químicas presentes nos alimentos que ingerimos. Esse sentido é, muitas vezes, um aspecto culturalmente elaborado por sistemas neurais de recompensa e punição, isto é, a experiência pode mudar a tolerância do paladar por aprendizado. Os seres humanos, por exemplo, têm uma preferência inata por sabores adocicados (como o leite materno) e um repulsa natural por substâncias amargas (como a maioria dos venenos). O também corpo reconhece necessidades de alguns nutrientes e desenvolve apetite por eles, como quando necessitamos de sal e ansiamos por comidas salgadas, mais ou menos como funciona o aspecto da sede. As substâncias que trazem prazer ao serem comidas são, comumente gordurosas ou muito doces, o que não coincidentemente contém altas concentrações de substâncias energéticas ao nosso metabolismo, indicando que o apetite por determinadas comidas é um aspecto cultural e fisiológico. O paladar também tem uma relação com a memória. Claro. você precisa se lembrar daquelas fontes alimentares que são preferenciais e aquelas perigosas, mas não é só isso. Na nossa rotina é possível perceber sua ligação com a memória quando comemos algo pela primeira vez e associamos a algo que já conhecemos ou quando você sente um cheiro de bolo de fubá e lembra da sua infância no interior de Minas. Nesse caso estamos falando de comidas afetivas, ou seja, fontes alimentares ligadas a experiências altamente positivas.

O paladar permite detectar a proximidade de alimentos, como no caso da hidra, que retrai seus tentáculos em direção a sua boca quando detecta o composto glutationa, liberado pela presa capturada pelos seus tentáculos. Diferentes formas de vida têm diferentes maneiras de perceber as moléculas químicas no meio, como insetos, que utilizam pelos gustatórios, contendo uma série de quimiorreceptores, cada um especialmente sensível a uma classe determinada de saborizante, como açúcar ou sal. Insetos também são capazes de sentir odores no ar usando pelos olfatórios, geralmente localizados nas antenas. Inclusive, os repelentes agem exatamente nessa estrutura: a substância N-dietil-meta-toluamida, presente nos repelentes comerciais, nos protege contra as picadas pois ela bloqueia o receptor olfatório nos mosquitos que detecta o cheiro humano.  Já a nossa língua, que é o nosso órgão especializado em perceber estes compostos químicos, é repleta de papilas gustativas, que têm formas diferentes capazes de perceber cinco tipos de sabores: doce, salgado, azedo, ácido e umami. 

Todas as regiões da língua possuem os seis tipos de papilas, entretanto, sabemos que algumas partes da língua sentem predominantemente alguns sabores. Por que isso ocorre? Bem, cada papila possui centenas de botões gustativos, que são células epiteliais modificadas, especializadas em receber o sinal químico do alimento e enviam ao SNC para ser interpretado no cérebro. Todo botão gustativo têm células receptoras para os cinco tipos de sabores, mas, por exemplo, naquela papilas localizadas na ponta da língua, as células receptoras de salgado, amargo, umami e azedo precisam ser estimulados de forma muuuuito intensa para enviar sinalização ao SNC, enquanto a célula receptora do doce detecta qualquer concentração de substâncias doces. Entendeu? Então, as regiões diferentes da língua sentem os sabores de formas diferentes.

Bem, vamos falar mais sobre o botão gustativo, então. Em uma das suas extremidades as células têm microvilosidades, para aumentar a área de contato com o alimento que você tá comendo. Uma vez que as moléculas do alimento se ligam aos receptores do botão gustativo, nessa região com microvilos, uma série de reações são desencadeadas dentro das células do botão, gerando um estímulo no neurônio sensorial aferente, que irá encaminhar a informação ao SNC. Vale lembrar, pra você não se confundir, que a língua não absorve nenhum nutriente, ela só detecta a presença deles e envia a informação para o cérebro. Se você está se perguntando qual a ligação do alimento que você come com a sensibilidade das papilas, é só você pensar que, o alimento que você come é rico em moléculas químicas. Por exemplo: o gosto salgado das coisas é pela presença de cloreto de sódio (NaCl). Ácidos dão a sensação de azedo, como o ácido cítrico que faz ser difícil de chupar um limão sem fazer careta. Carboidratos como frutose, glicose, sacarose e quinina, dentre outros, sinalizam pra o seu cérebro que a substância ingerida é doce. Já o Glutamato Monossódico, presente no tomate, cogumelos, molhos prontos, condimentados e industrializados de uma forma geral, sinalizam o sabor umami (significa delicioso, em japonês). A língua vai captar principalmente as moléculas não-voláteis, hidrofílicas, logo, aquelas que são solúveis em saliva (que é aquosa). Se você não se lembra, volátil é aquela substância que evapora com facilidade. A língua lida com aquelas que não evaporam facilmente. As voláteis são captadas pelo olfato.

Isso mesmo, você consegue "cheirar" algo que você está comendo por dentro da boca, enquanto mastiga. Se você se lembrar bem, o nariz e a boca são conectados, ou seja, a cavidade nasal é conectada com a cavidade oral. Por isso que você consegue engolir catarro e expelir coca-cola pelo nariz quando prende uma risada. Por isso também, logo depois de vomitar, mesmo que você saia do ambiente vomitado, ainda fica sentindo o cheiro de vômito e um gosto ácido. Por serem conectadas, algumas partículas voláteis que evaporam do alimento que você está mastigando são detectadas pelos nervos olfatórios, lá no nariz. Então é como se você "cheirasse por dentro". É daí que vem a diferença entre gosto e sabor. O gosto do alimento diz respeito às partículas químicas percebidas pelas suas papilas gustativas. O sabor é mais complexo: é o gosto somado às partículas voláteis percebidas pelo interior do nariz. Então sabor é cheiro + gosto. Olfato + paladar. Juntos. Por isso que você tem dificuldade de sentir o sabor dos alimentos quando está resfriado. O gosto fica intacto, suas papilas gustativas estão funcionando normalmente, mas pela quantidade de muco acumulado no interior da sua cavidade nasal, as células sensoriais ficam cobertas, não conseguindo perceber as moléculas voláteis evaporada dos alimentos. Mas nem tudo é ruim, com o sabor dos alimentos comprometido, não se torna tão torturante beber aquele chá de boldo pra curar o resfriado.

Falando um pouco sobre o olfato, ele consiste na capacidade de reconhecer e discernir um amplo número de moléculas químicas voláteis em suspensão no ar com grande precisão e sensibilidade. A olfação permite um monitoramento contínuo do ambiente, incluindo sinais químicos que identificam alimentos, predadores, crias e parceiros. Os seres humanos têm cerca de 10 milhões de quimiorreceptores olfativos que possuem vida curta, de cerca de 60 dias. Entretanto, as células receptoras olfativas são, na realidade, os próprios neurônios e, portanto, são os únicos neurônios que se regeneram continuamente durante toda a vida.

Estudos com humanos e animais mostram que a percepção de odores é modulada por experiência, pelo estado fisiológico (fome), estados emocionais (medo) e estados hormonais (reprodução e condição parental). A codificação olfativa lembra a codificação gustativa, pois a maioria dos odores naturais consiste de moléculas que excitam várias classes de quimiorreceptores olfativos. A codificação de determinado odor depende da resposta de vários quimiorreceptores olfativos e a intensidade do odor. Axônios olfativos individuais se projetam para os glomérulos olfativos, específicos para cada tipo de estímulo, no bulbo olfativo (lembra de quando vimos as regiões do cérebro lá em cima?). 

Nós temos quimiorreceptores para mais de mil tipos de odores diferentes, como já disse. Então, é por isso que misturas de cheiros produz uma informação diferente do que
 

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seria se fossem esses mesmos cheiros separados. "Estudos em modelos animais revelam que misturas complexas de substâncias odorantes não são processadas como a soma simples de cada informação. Em vez disso, o cérebro integra as informações olfatórias de diferentes receptores em uma única sensação. Essas sensações contribuem com a percepção do ambiente atual e com a memória de eventos e emoções".

Sentidos

Visão

O olho é uma das estruturas mais incríveis da natureza. No caso do olho humano, uma incrível quantidade de estruturas se ocupam em captar estímulos luminosos, que são interpretados pelo cérebro. A luz (a partir da esquerda, no esquema) entra pela abertura da pupila e atinge a retina, passando por camadas em grande parte transparentes de neurônios antes de atingir os bastonetes e cones, dois tipos de fotorreceptores que diferem em forma e função.

O nosso olho consegue distinguir dois aspectos luminosos: o brilho (ou luminosidade) e o comprimento de onda (cor). A retina é o epitélio sensorial especializado do olho, onde estão localizados os fotorreceptores (cones e bastonetes). Os bastonetes são melhores adaptados a condições de baixa luminosidade, auxiliando a distinguir contrastes. Os cones são melhor adaptados a condições de luminosidade, sendo responsáveis pela acuidade visual e visão de cores. Dentro do segmento mais exterior de um cone ou de um bastonete encontramos os pigmentos visuais. Isso não tem a ver com a cor do seu olho não, tá? A cor do seu olho é a coloração da iris. Esses pigmentos são chamados de retinol, que é um composto derivado da Vitamina A. Lembra daquele papo de que a vitamina A faz bem pra visão e tal? Então, é por isso. O retinol tem dois isômeros: um cis e um trans. Acontece que a energia luminosa têm a capacidade de transformar a forma cis na forma trans, o que desencadeia uma série de reações químicas no interior das células, levando informações sobre a intensidade luminosa ao cérebro. É assim que você consegue diferenciar uma luz mais intensa de uma menos intensa: modificações químicas nas moléculas de retinol.

O processamento da informação visual se inicia na retina, como estamos vendo, onde tanto cones quanto bastonetes fazem sinapses com células bipolares. Cada célula bipolar recebe informações de vários bastonetes ou cones, e cada célula ganglionar reúne informações de várias células bipolares. Células horizontais e amácrinas integram as informações em toda a retina. Em seguida, os neurônios da retina transmitem a informação visual captada por fotorreceptores ao nervo óptico (que é um dos pares de nervos cranianos) e ao cérebro, ao longo dos caminhos mostrados com setas vermelhas. Na região conhecida como disco óptico, que não possui fotorreceptores, constitui um “ângulo morto”, onde a luz não é detectada. A luz visível para humanos é aquela que compreende os comprimentos de luz entre 370 e 750 nm. Outros organismos vivos conseguem ver comprimentos de onda diferentes desse. Dentre os mamíferos noturnos notamos uma maior quantidade de bastonetes em relação à cones, dada a característica desse tipo de célula. Ela melhora a capacidade de distinguir formas sob baixa luminosidade, o que faz com que esses animais enxerguem bem à noite. 

Vamos falar um pouco mais sobre os cones. Olhe para o degradê ao lado. Nos seres humanos, a percepção da cor se dá graças à três tipos de cones, que possuem diferentes pigmentos visuais – vermelho, verde ou azul. Cada um tem a respectiva absorção ótima nesse comprimento de onda. Esses três pigmentos visuais, chamados fotopsinas, são formadas a partir da ligação da retinal a três proteínas opsina diferentes. Pequenas diferenças nas proteínas opsina são suficientes para que cada fotopsina tenha uma absorção ótima de luz em um comprimento de onda diferente, já que como você sabe, o que determina o espectro de absorção e reflexão de comprimentos de onda por uma molécula é a sua própria constituição química e geometria molecular. Mas você sabe que não enxerga somente vermelho, verde e azul (o famoso RGB, em inglês), afinal, você consegue enxergar o degradê inteiro, né?

Um pigmento que absorve "otimamente bem" o comprimento de onda azul (420nm) não absorve somente ele e mais nenhum, mas possui um certo espectro de absorção, que vai diminuindo conforme se afasta do ótimo, tanto para mais quanto para menos. O mesmo acontece para o verde e para o vermelho, de modo que todas as cores do desde 380 até 750 nm são percebidos por pelo menos um dos três tipos de pigmentos. As tonalidades intermediárias são percebidas por que seus espectros de absorção se sobrepõem. É como aquela brincadeira de "misturar tintas" pra formar novas cores. Por essa razão, a percepção do cérebro de tons intermediários depende da estimulação diferencial de duas ou mais classes de cones. Então, por exemplo, para você ver a cor laranja, que é por volta de 600nm, você tem uma estimulação tanto do cone vermelho (um pouco mais) quanto do cone verde (um pouco menos) e nenhuma estimulação do cone azul.

Investigando a física da visão 

Fiz uma espécie de FAQ aqui para responder fisicamente perguntas relativas à visão:

Como enxergamos os objetos? 

Acreditavam os antigos que a capacidade de visualização devia-se a um estranho mecanismo que consistia no fato de os olhos lançarem linhas invisíveis terminadas em ganchos ("anzóis") que capturavam os detalhes dos objetos visados e traziam as informações aos órgãos visuais, possibilitando enxergar. Tão logo foi aprimorada a noção de luz, através da física, essa teoria foi demovida mediante o seguinte argumento: não é possível enxergar em ambientes totalmente escuros. Enxergar os objetos, portanto, demanda que você esteja em ambiente com alguma quantidade de luz. A luz emitida por alguma fonte de luz primária (sol, lâmpada, vela) se espalhará pelo ambiente e será refletida e absorvida por todos os corpos que estão ali. Vamos supor que você acenda a luz do seu quarto. A os raios luminosos emitidos pela lâmpada atingirão todos os objetos desse cômodo. Eles irão absorver parte dessa radiação luminosa e refletir outra parte. É justamente as frequências luminosas que eles refletem e que chegam ao seu olho que te fazem vê-los. Só que só nós enxergamos aquelas frequências de radiação luminosas que estão dentro do espectro eletromagnético, entre 380 e 750 nm de comprimento de onda. Fora disso, qualquer frequência passa desapercebida pelos nossos olhos.

Como que as estruturas do olho atuam se compararmos com um experimento clássico de ótica?

Observando a imagem ao lado, vemos uma lente convergente, que é capaz de desviar os raios luminosos paralelos para um comportamento convergente, isto é, em direção à um ponto focal único. É exatamente como uma lente convergente que uma estrutura do nosso olho chamada de cristalino age. A imagem será formada na retina, que fica no ponto de foco. Quando esse ponto de foco está antes da retina, dizemos que a pessoa é míope; quando está depois, hipermétrope. Vale lembrar que os músculos ciliares podem controlar a forma do cristalino, fazendo com que ele desvie mais ou menos a luz, possibilitando que enxerguemos melhor objetos mais longe ou mais perto. Quando você concentra seus olhos em um objeto próximo, suas lentes tornam-se quase esféricas, de forma involuntária. Quando você visualiza um objeto distante, suas lentes se achatam. Isso é um ajuste automático de foco, feito de forma involuntária pelos músculos ciliares.

Anableps anableps, o peixe 'quatro olhos'

O Anableps anableps, mais conhecido como “cuatro ojos” (“quatro olhos”), desliza pelos lagos de água fresca na América Central e do Sul com a metade superior de cada olho para fora da água. A metade superior do olho é particularmente adaptada à visão aérea, e a metade inferior, à visão aquática. A base molecular para essa especialização foi revelada recentemente: as células de ambas as partes dos olhos expressam um conjunto levemente diferente de genes envolvidos na visão, mesmo que esses dois grupos de células sejam bastante semelhantes e contenham genomas idênticos. Que mecanismo biológico sustenta a diferença na expressão gênica e possibilita essa incrível façanha?

Audição

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Tato

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Memória

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O que é o Déjà vu?

Além de uma banda baiana dona dos sucessos "Nave do Amor" e "Me libera", damos o nome de dejavú para a sensação de estar repetindo vivências e memórias, como num lapso temporal. A sensação de Déjà vu não tem hora pra acontecer.

Sentimentos

Sentimentos e Emoções

Existe uma dicotomia entre "razão e emoção" que não ajuda em nada a entendermos o que são os sentimentos. Além disso, o coração não tem nenhuma relação com a geração desses sentimentos, só é representado dessa forma por ser um dos órgãos afetados por descargas de adrenalina, por exemplo. Então, tanto a racionalidade quanto as emoções são obras da nossa mente. Ambas fazem parte da experiência humana e nenhuma das duas deve ser subjugada, até por que não competem entre si.

As pessoas costumam entender o sentimento como aquilo que atrapalha a razão humana, colocando sempre os dois em antagonismo. Entretanto, segundo Antonio Damásio, foram justamente os sentimentos aqueles capazes de nos incentivar à toda criação cultural que nos trouxe até aqui. Segundo o autor, em circunstancias comuns  os sentimentos são produzidos em resposta ao mundo externo e interno para avaliar os processos que estão ocorrendo. Se este processo é perigoso ou potencialmente danoso, sentimentos ruins são desenvolvidos. E nós sabemos qual o poder de um sentimento ruim nas nossas ações, certo? Então, os sentimentos basicamente comunicam à nossa consciência se aqueles processos são bons ou maus, qualificando o processo da vida na direção do bem-estar e da prosperidade. Os sentimentos são resultado de uma construção conjunta entre corpo e mente (vamos parar de tentar separá-los, como se o cérebro fosse uma pessoa comandando outra pessoa), surgidos para tomar conta da nossa homeostase e integridade. Eles são os representantes mentais do estado da vida no interior de um organismo, que nos protegem. Pense em quantas vezes o medo da morte te salvou de morrer ou quantas vezes. Ou quantas vezes você já ouviu que a felicidade melhora a saúde? Do outro lado do pêndulo, já é bem documentado na ciência que o estresse tem a capacidade de destruir processos e estruturas no seu corpo. Damásio diz, inclusive, que o medo do desconhecido foi o principal motor para o empreendimento do que hoje chamamos de ciência.

O autor argumenta ainda que os sentimentos, por exemplo, de sofrimento e prosperidade (os extremos opostos) devem ter sido os motivadores primordiais da inteligência criativa que produziu as culturas. E você sabe disso: já falou alguma vez que "A necessidade é mãe da invenção". Mas é mais do que a necessidade: é o sofrimento que o necessitado vive que o impulsiona a inventar.

A emoção tem um componente evolutivo, o que Charles Darwin deixa claro no livro "A Expressão das Emoções no Homem e nos Animais". Vale lembrar que Darwin não estabelece que são sentimentos comparáveis, até por que os sentimentos em humanos precisam de um certo grau de abstração que não temos evidências se existem em animais. Imagina se Darwin teria, claro que não. Ele só quer dizer que existe um componente evolutivo e, por isso, algumas emoções encontram certa precedência em outras espécies.

As emoções ainda têm uma conexão direta com a cultura  e história de vida dos indivíduos. Por exemplo: é comum que todos sintam medo ao ver um urso, mas nem todos experimentam o ciúme da mesma forma ou nem todos experimentam felicidade a partir de um mesmo estímulo.

As emoções também tem uma relação importante com a memória, no sentido de experiências emocionais que  são armazenadas como memórias, de modo que podemos acessá-las por circunstâncias semelhantes. Como por exemplo, pessoas que sofreram traumas, como esfaqueamento terem medo de facas, no geral. Entende-se que este medo foi grado por uma experiência anterior negativa que foi guardada na memória e os nossos sistemas de aprendizado remetem o objeto "faca" a essa experiência, não importando se é uma faca de manteiga ou até mesmo de brinquedo. Ver uma faca pode desencadear um aumento da frequência cardíaca, sudorese e um estado mental de medo. A estrutura do cérebro que é mais importante para essa memória emocional é a amígdala, uma massa de núcleos (grupos de neurônios) em formato de amêndoa localizada perto da base do cérebro. Não é a amígdala da garganta não, tá?

Quais emoções temos e onde elas se formam?

O consenso científico reconhece seis emoções presentes em todos os seres humanos: medo, ira, nojo, alegria, tristeza e surpresa. cada emoção têm sua própria origem e mecanismos. Para construir a emoção de medo, por exemplo, nosso cérebro utiliza estruturas como as amídalas, de modo que pacientes com lesões nas amígdalas parecem não ser susceptíveis ao medo, segundo estudos recentes. Numa variante das clássicas experiências de Pavlov, chamada de "Medo Condicionado", é apresentado a um sujeito experimental um estímulo neutro, como uma imagem ou um som. Em seguida, lhe é proporcionado um estímulo desagradável, como uma pancada ou choque elétrico. Ao fim de algumas sessões de aplicação de ambos os estímulos, o sujeito acaba por associá-los e mostra reações de medo quando é exposto somente ao estímulo de som ou imagem (aquele neutro), mesmo que não tenha o estímulo desagradável por conseguinte. A amígdala, nesse caso, é ativada na situação de medo antecipatório. 

Em relação à ira (também conhecida como cólera ou raiva), temos a ativação de respostas agressivas do corpo, que se prepara para iniciar uma situação de luta ou fuga. É a única emoção que configura como um pecado capital pela Igreja Católica, mas para a evolução, ela é muito bem-vinda sim, pois nos ajuda em situações de conflitos. Biologicamente, temos nossos mecanismos de ira e ele é muito útil à sobrevivência. Falando em relação ao cérebro, a região ativada para desencadear essa emoção é a mesma utilizada nos processos de aproximação social (curioso, não?), que é a região orbital frontal.

O nojo é uma ação repulsiva à algo desagradável. Costumamos ter nojo daquilo que aprendemos ser infectado, sujo e potencialmente causador de doenças, certo? No cérebro, a principal região envolvida nessa reação é o córtex insular, que é uma região dobrada no interior do sulco central, então não é visível por fora. Agora, o fato curioso é que essa região é ativada tanto através de estímulos visuais, gustativos e olfativos quanto se você perceber alguém com a expressão facial de nojo.

A alegria é incentivada principalmente por moléculas que induzem o estado de euforia, como opioides (morfina, heroína), álcool, tetrahidrocanabidiol, anfetaminas, metanfetaminas cocaína e barbiturato. Não é atoa que a maioria delas é usada como "drogas" cujo principal efeito esperado é a euforia e sensação de bem estar. Entretanto, vale lembrar que essas substâncias são naturalmente encontradas e são utilizadas por povos tradicionais com essa finalidade por muitos milênios. Já a tristeza, com aprendemos no filme Divertidamente, tem o seu papel evolutivo também, tendo sido preservada por esse processo. A região ativada para gerar esse sentimento é a pré-frontal medial, além do hipocampo, amígdala e hipotálamo.

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